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A prisão de Daniel Silveira e os paradoxos processuais

O artigo aborda os paradoxos processuais em torno da prisão do deputado Daniel Silveira, analisando a legalidade da medida e as implicações de decisões do STF. Os autores discutem a questão da prisão em flagrante, sua natureza temporária e a falta de fundamentação adequada para sua continuidade, além de examinar a competência do STF em julgar o caso, dado que as declarações do parlamentar não estão ligadas ao seu mandato. O texto critica a possibilidade de um tratamento privilegiado e a incoerência nas interpretações legais que envolvem questões de autoritarismo e democracia.

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Vamos recordar que lá no início de 2019, diante dos ataques ao STF e divulgação de fake news, foi instaurado — de ofício — pelo ministro Dias Toffoli o Inquérito 4781, designando o ministro Alexandre de Moraes como autoridade investigadora. E aqui começamos com o jogo dos (no mínimo) sete paradoxos processuais:

— Paradoxo 4: em fevereiro de 2021 surge o inusitado mandado de prisão em flagrante expedido pelo ministro Alexandre de Moraes contra o deputado federal Daniel Silveira. E aqui um parêntese: nenhuma dúvida sobre a gravidade e reprovabilidade desse ataque absurdo a instituições e pessoas, que merece total repúdio e necessária apuração e punição. Depreciamos tudo o que ele representa, mas não se combate fascismo e prepotência com autoritarismo e ilegalidade. A insólita decisão do ministro Alexandre de Moraes (também vítima dos crimes contra a honra perpetrados) de determinar a prisão em flagrante gerou intenso debate. De um lado aqueles que sustentam não se tratar de crime permanente, mas, sim, um crime instantâneo de efeitos permanentes. Nesse caso, a prisão em flagrante é ilegal ab initio. De outro, aqueles que admitem a tese do ministro — de que existe crime permanente — e, portanto, a teor do artigo 303 do CPP, haveria uma situação de flagrante igualmente permanente. Finalmente, aqueles que sustentam que, embora seja crime instantâneo, a prisão ainda se qualificaria justificadamente como em flagrante pois realizada “logo após”, tal como previsto na disposição legal. No entanto, mesmo reconhecendo plausível este entendimento é preciso atentar para o fato de que não foi essa a fundamentação concretamente empregada pelo ministro Alexandre de Moraes. Sobre a decretação de ofício, cabe sublinhar que, como não se tratou de prisão preventiva, não haveria nada de ilegal, até porque, segundo o artigo 301 do CPP, qualquer pessoa do povo pode e as autoridades devem prender quem estiver em flagrante delito.

— Paradoxo 6: a prisão em flagrante não pode manter alguém preso por si só, sem a decretação de prisão preventiva ou temporária. É uma medida pré-cautelar, precária (tanto que pode ser efetivada por qualquer pessoa) que vige até a apresentação na audiência de custódia. Hoje, o deputado está submetido a uma prisão absolutamente ilegal, pois flagrante não é um título prisional válido para prolongar-se assim no tempo.

Foi marcada uma audiência de custódia que não cumpriu com a sua função, a qual, ao mesmo tempo, provou-se inútil, pois a prisão ainda não havia sido avalizada pela Câmara dos Deputados. A audiência de custódia serve para avaliar — em contraditório e com oralidade — dois aspectos básicos, desenhados no artigo 310 do CPP: analisar se o flagrante é legal (homologar) ou ilegal (relaxar a prisão). Se legal (e o plenário do STF havia se manifestado nesse sentido, não passou de um faz de contas, nesse caso), obrigatoriamente deveria ter analisado se cabível a prisão preventiva (ou temporária), desde que existisse pedido expresso (nada de conversão de ofício, ilegalidade que está superada). Então caberia ao juiz a verificação da presença/ausência de fumus comissi delicti e periculum libertatis para — se presentes —, em primeiro lugar, substituir pelas medidas cautelares constantes do artigo 319, quando adequadas e suficientes, ou, na hipótese de que incabíveis estas cautelares diversas, apenas em último caso (verdadeira ultima ratio), então, passar à decretação da prisão preventiva.

Os paradoxos, que a esta altura já são abundantes, não param por aqui.

O PGR já ofereceu no STF, em tempo recorde e nunca visto, a denúncia contra o deputado federal. Mas compete ao STF processar e julgar, já que o réu tem prerrogativa de função? Não! Conforme entendimento consolidado pelo próprio STF na AP 937, somente será julgado no STF se o crime for praticado durante o exercício do mandato e tiver relação com o exercício das funções, isto é, propter officium. E, nesse caso, a própria denúncia já ofertada no STF afirma categoricamente que não há imunidade material pelas palavras porque as declarações dele não têm relação com o mandato. Em todos os casos similares, diante da ausência da prática de ato vinculado ao cargo, o STF declinou a competência para o primeiro grau.

Inclusive, se ele renunciar antes de encerrada a instrução (como já se cogitou na mídia), não haverá perpetuatio jurisdictionis, pois outra criação do STF na AP 937 é exatamente esta: a partir do princípio da atualidade do exercício da função, se ele for cassado ou renunciar antes de encerrada a instrução, o feito deverá ser redistribuído para o primeiro grau, pois o STF não julga ex-deputado.

Enfim, além de todos esses atropelos, o STF ainda terá de engolir o entendimento restritivo da prerrogativa que ele mesmo criou, para poder julgar esse caso em que seus ministros são vítimas. Um casuísmo absurdo, autoritário e preocupante. O respeito às regras do jogo e do juiz natural é fundamental. É fácil defendê-las para quem gostamos, mas o compromisso com a democracia impõe a sua defesa principalmente em favor daqueles de quem não gostamos. Não custa lembrar: “democracia seletiva” não existe.

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