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Lógica de Lampedusa precisa ser repensada no Processo Penal

O artigo aborda a necessidade de reavaliação da lógica de Lampedusa no contexto do Processo Penal brasileiro, destacando a persistência de práticas jurídicas ultrapassadas apesar das reformas legislativas e da nova Constituição de 1988. O autor, Alexandre Morais da Rosa, critica a resistência a um modelo acusatório e a manutenção de uma mentalidade inquisitória, sugerindo que se faz necessário um diálogo entre a academia e a prática forense para promover um verdadeiro Estado Democrático de Direito. Além disso, menciona obras recentes que buscam alinhar o Processo Penal às diretrizes democráticas e à proteção dos direitos humanos.

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A prática do Processo Penal adornada pelos livros do senso comum teórico deixa evidenciado que não obstante mais de 25 anos de Constituição da República, mesmo assim, seu impacto, bem assim o da Convenção Americana de Direitos do Homem parece não ser suficiente para a superação de um mínimo patamar legislativo e doutrinário do modelo jurídico precedente. Continuamos com autores medievais no Processo Penal de hoje, salvo algumas poucas exceções.

Na verdade não é exagero pensar que um ator jurídico que vivesse sua vida profissional nos anos 1980, por exemplo, poderia se sentir muito confortável na sua atuação profissional mais de trinta anos após dada as reiterações da (in)cultura jurídica que reproduz padrões de pensamento – e, portanto, de práticas – que não se modificam com as sucessivas reformas fragmentadas do Código de Processo Penal, as quais tendem a reproduzir “o mais do mesmo” com a nítida sensação de que, com elas ou sem elas, tudo continuaria da mesmas forma.

A fórmula de Lampedusa prevalece: “É preciso que tudo mude para que tudo se mantenha.” Talvez, mesmo, os livros de processo penal de 1987, com alguma maquiagem, sejam os mesmos (conteúdo) de 2014. Basta apontar que o “novo” modelo cautelar, atuado a duras penas e com vocação para reproduzir de forma idêntica o “modelo anterior”, o modo de gerenciamento da prova em audiência na patética discussão sobre a forma de aplicar o art. 212 do CPP ou a “reforma” do júri que em nada serviu para prestigiar a produção probatória perante o juiz natural, o Conselho de Sentença. Muda-se a lei e as cabeças se negam a compreender. Fazem ouvidos moucos.

Embora tenha sido editada uma nova Constituição em 1988 há um inescondível déficit hermenêutico nos campos do Direito e Processo Penal no Brasil. A compreensão do Direito Penal e Processual válido precisa de um realinhamento constitucional do sentido democrático, uma vez que tanto o Código Penal como o Código de Processo Penal são documentos editados, na matriz, sob outra ordem constitucional e ideológica, bem assim porque houve significativa modificação do desenho político criminal contemporâneo.

Ademais, a Constituição acolheu os Direitos Humanos em patamar capaz de dar eficácia imediata no campo de controle social. De sorte que há a necessidade de adequação da própria noção do papel e função do Direito e do Processo Penal diante da redemocratização do país. E, este trabalho ainda está sendo realizado, basicamente por força da (i) baixa constitucionalidade, entendida como a ausência de uma cultura democrática no Direito; (ii) resistência ao modelo eminentemente acusatório (devido processo legal substantivo) preconizado pela Constituição da República de 1988, com a manutenção de uma mentalidade inquistória; (iii) herança equivocada de uma imaginária e nefasta “Teoria Geral do Processo”, quando, na verdade, os fundamentos do processo penal democrático assumem viés individual e não coletivo, a saber, não cabe “instrumentalidade processual penal”; (iv) difusão de um modelo coletivo de “Segurança Pública” que fomenta uma certa “Cultura do Medo”; (v) expansionismo do Direito Penal e recrudescimento dos meios de controle social; (vi) prevalência de teorias totalitárias, como Direito Penal do Inimigo, atreladas ao discurso da Lei e da Ordem.

Neste contexto, parece que se mostra necessário repensar as coordenadas simbólicas do campo do Direito e Processo Penal desde uma perspectiva crítica, mas sem se descolar da práxis, ou seja, da possibilidade de diálogo entre o saber produzido no campo da universidade e o que acontece no plano da prática forense, não na perspectiva unitária, mas sim de um diálogo proveitoso, em que o ponto de partida seja a realização do Estado Democrático de Direito.

Assim, a semana foi produtiva com o lançamento, pela editora Saraiva, da 6ª edição do Código de Processo Penal – Comentários consolidados e crítica jurisprudencial, de Fauzi Hassan Choukr, membro do Ministério Público de São Paulo que não se nega a pensar e possui a coragem, rara, de rever as posições. A obra se insere no contexto da busca de uma interpretação processual penal em conformidade com as bases constitucionais e convencionais de um ordenamento que deve servir como instrumento de defesa da liberdade a partir do devido processo legal substancial, ao mesmo tempo em que orienta a forma de produção de uma persecução penal no Estado de Direito o que, se não configura a solução para todos as dificuldades substanciais do “sistema penal”, ao menos configura uma tentativa de diminuir os nítidos desequilíbrios encontrados nos momentos de exceção ao marca da legalidade democrática dentro dos quais o velho — de ideias e ideais — Código de Processo Penal foi parido.

Enquanto procurarmos no lugar errado, tal qual os fiscais do caso Nasreddin, a resposta será a mesma. Talvez seja o caso de ousarmos e, na busca de horizontes mais democráticos, o lançamento do Código de Processo Penal de Fauzi Hassan Choukr, pode ser um caminho, assim como os livros de Jacinto Nelson de Miranda Coutinho, Aury Lopes Jr e André Luiz Nicolitt, dentre outros. Só assim é possível alterar a lógica de Lampedusa. Que se tenha coragem. Bom final de semana.

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