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Qual o significado jurídico da posse de Lula como ministro?

O artigo aborda questões processuais relacionadas à posse de Lula como ministro, destacando a prerrogativa de foro e a aplicação do princípio da “Atualidade do Exercício da Função”. Discute-se a necessidade de remeter processos ao STF quando há conexão entre réus e a possibilidade de separação de julgamentos, o que gera controvérsias e incertezas quanto à aplicação das normas do Código de Processo Penal. Além disso, a análise traz reflexões sobre a discricionariedade judicial e a proteção das garantias processuais.

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Várias questões processuais serão discutidas. Recordemos primeiro a questão temporal: (a) se o crime foi cometido antes da posse, ele adquire a prerrogativa; (b) se o crime foi cometido durante o exercício do cargo ou função, ele tem prerrogativa; e (c) em qualquer caso, cessado o exercício do cargo ou função, perde a prerrogativa e o processo é remetido para a justiça competente de primeiro grau.

Prevalece no STF o entendimento da aplicação da ‘Atualidade do Exercício da Função“, ou seja, cessada função, cessa a prerrogativa. Por exemplo, se Dilma renunciar, formalmente, ou for destituída por impeachment, Lula e a própria Dilma responderão por eventuais crimes no primeiro grau de jurisdição (aplicando-se as regras normais de definição da competência a partir da conexão).

Nos casos de foro de prerrogativa de função, a investigação deve ser conduzida, com o apoio da Polícia Judiciária, pelo órgão julgador competente, a partir de requerimentos específicos, dentre eles o de indiciamento (STF, Inquérito 2.411). Por mais que a atividade investigatória não seja conduzida diretamente pelo Judiciário, demanda sua ciência e autorização, razão pela qual as ações em tramitação que envolvam Luiz Inácio Lula da Silva, em primeiro grau, deverão ser remetidas ao Supremo Tribunal Federal.

A segunda questão é: e os procedimentos que tramitam em primeiro grau? É tudo remetido para o STF, inclusive as eventuais investigações em curso precisam ser autorizadas pelo STF. Mas e os demais corréus? Como fica a situação do filho de Lula e da mulher? Se forem acusados? Eis o ponto nevrálgico da discussão, porque o correto — à luz das regras básicas da conexão e da continência — é reunir tudo no STF. Havendo concurso de pessoas e tendo uma delas prerrogativa de função, a reunião dos processos para julgamento simultâneo se dá no foro privilegiado (no caso, no STF). Essa é uma regra clara e objetiva do CPP, nos termos dos artigos 76 (conexão), 77 (se fosse continência) e 78 (regras definidoras em caso de conexão ou continência). Na hipótese, incide, sem sombra de dúvidas o disposto no artigo 78, inciso III do Código de Processo Penal.

Destacamos que a leitura do artigo 78, do CPP, exige a compreensão de que as disposições do inciso II somente se aplicam quando não for hipótese de incidência dos incisos I, III e IV. Em outras palavras, os incisos do artigo 78 devem ser lidos na seguinte ordem: primeiro o inciso IV, depois o III, depois I e finalmente o inciso II, que deverá ser aplicado por último, ausentes as situações descritas nos outros incisos[3]. Entretanto, o STF adota posição de conveniência, a la carte, conforme o caso, já que tanto determinou a cisão como manteve a unidade de julgamentos, sem critérios objetivos de coerência, ampliando o decisionismo e causando perplexidade na comunidade jurídica. A tendência atual, aliás, é a cisão, mantendo-se apenas o acusado detentor do cargo/função, remetendo para o primeiro grau os demais envolvidos sem prerrogativa, ao contrário do que se deu no mensalão. Seria mais “um ponto fora da curva”?

Enfim, a “família Lula” será processada e julgada no STF ou haverá cisão? Pela sistemática do Código de Processo Penal, serão todos os fatos apurados, em unidade, pelo STF. Mas pelas últimas decisões do STF, haverá cisão. Percebam como é ruim termos tanto espaço impróprio de discricionariedade judicial? O quanto é perverso o decisionismo e o decido-conforme-a-minha-consciência-e-dane-se-a-lei? (Streck).

A renúncia do mandato ou função, contudo, às vésperas do julgamento, com o fim de frustrá-lo, também foi superada pelo julgamento da Ação Penal Originária 396, em que o STF decidiu se tratar de “abuso de direito” com o fim de fraudar a aplicação da lei. Essa é uma decisão pontual e excepcional, porque situações iguais tinham ocorrido no passado e gerado prescrição/ impunidade. Mas é uma decisão excepcional. Poderá o STF entender que também a nomeação de Lula é uma fraude, modalidade de “abuso de direito”? É possível, até porque não se sabe quais as regras do jogo atualmente. A nomeação de ministros parece prerrogativa da Presidenta e seria modalidade de controle “fora da curva” e bastante forte. Possível, mas pouco provável.

Por último: alguns podem ler esse artigo como sendo de “coxinhas” ou de “petralhas”, reducionismo que está tornando cada vez mais complicado discutir-se as regras do jogo democrático. A “cegueira deliberada” das regras do jogo em nome do resultado que é conveniente transforma as regras do jogo processual em obstáculo a ser superado. Investigação, devido processo legal e punição são escolhas democráticas e decorrentes do processo civilizatório. Não defendemos a impunidade e não fazemos a campanha ‘adote um corrupto e leve pra casa’. Os culpados devem ser punidos dentro das regras do jogo. Punir sem regras é retrocesso civilizatório.

[1] STF – ARI 1.376-4 (Min. Celso de Mello): “A prerrogativa de foro é outorgada, constitucionalmente, ‘ratione muneris’, a significar, portanto, que é deferida em razão de cargo ou de mandato ainda titularizado por aquele que sofre persecução penal instaurada pelo Estado”. [2] A Súmula 394/STF (“Cometido o crime durante o exercício funcional, prevalece a competência especial por prerrogativa de função, ainda que o inquérito ou ação penal sejam iniciados após a cessão daquele exercício”.) foi cancelada pela Questão de Ordem no Inquérito 687/SP, prevalecendo a tese – atual – de que o foro de prerrogativa de função somente é válido no exercício do mandato. A alteração legislativa do §1º, do art. 84, do CP, que buscava manter a prerrogativa mesmo depois de encerrado o mandato foi declarado inconstitucional pelo STF (ADIns 2.797-2 e 2.860-0). Prevalece, todavia, a competência originária para julgamento das ações de improbidade (STF, Pet. 3211). [3] LOPES JR, Aury. Direito Processual Penal. São Paulo: Saraiva, 2016, p.

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