Artigos Conjur – Juiz não pode converter flagrante em preventiva de ofício

Artigos Conjur
Artigos Conjur || Juiz não pode converter fla…Início / Conteúdos / Artigos / Conjur
Artigo || Artigos dos experts no Conjur

Juiz não pode converter flagrante em preventiva de ofício

O artigo aborda a ilegalidade da conversão de ofício da prisão em flagrante em prisão preventiva durante a audiência de custódia. Os autores, Alexandre Morais da Rosa e Aury Lopes Jr., enfatizam que tal conversão deve ser precedida de requerimento da autoridade policial ou do Ministério Público, em conformidade com o art. 311 do CPP. Eles criticam a persistência de práticas inquisitórias e defendem a necessidade de se respeitar as garantias de imparcialidade e do sistema acusatório no processo penal brasileiro.

Artigo no Conjur

1º Momento: analisar o aspecto formal do auto de prisão em flagrante, bem como a legalidade ou ilegalidade do próprio flagrante, através da análise dos requisitos do art. 302 do CPP. Se legal, homologa; se ilegal (nos casos de flagrante forjado, provocado etc.), deverá relaxá‑la.

2º Momento: homologando a prisão em flagrante, deverá, sempre, enfrentar a necessidade ou não da prisão preventiva (se houver pedido), a concessão da liberdade provisória com ou sem fiança e a eventual imposição de medida cautelar diversa.

No primeiro momento, o que faz o juiz é avaliar a situação de flagrância, se realmente ocorreu alguma das situações dos arts. 302 ou 303, e ainda, se todo o procedimento para elaboração do auto de prisão em flagrante foi devidamente desenvolvido, especialmente no que tange à comunicação imediata da prisão ao juiz, a entrega da nota de culpa ao preso e a remessa ao juízo no prazo de 24 horas. É, em última análise, a fiscalização da efetivação do disposto no art. 306.

Superada a análise formal, vem o ponto mais importante: a concessão da liberdade provisória (com ou sem a aplicação das medidas cautelares diversas) e, em último caso, a decretação da prisão preventiva.

A “conversão” da prisão em flagrante em preventiva não é automática e tampouco despida de fundamentação. E mais, a fundamentação deverá apontar – além do fumus commissi delicti e o periculum libertatis – os motivos pelos quais o juiz entendeu inadequadas e insuficientes as medidas cautelares diversas do art. 319, cuja aplicação poderá ser isolada ou cumulativa.

Mas o ponto mais importante é: não pode haver conversão de ofício da prisão em flagrante em preventiva (ou mesmo em prisão temporária). É imprescindível que exista a representação da autoridade policial ou o requerimento do Ministério Público. A “conversão” do flagrante em preventiva equivale à decretação da prisão preventiva. Portanto, à luz das regras constitucionais do sistema acusatório (ne procedat iudex ex officio) e da imposição de imparcialidade do juiz (juiz ator = parcial), não lhe incumbe “prender de ofício”. Ademais, o próprio art. 311 do CPP é expresso:

“Art. 311. Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, se no curso da ação penal, ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial”.

Portanto, somente caberá prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, se no curso da ação penal (rectius “processo”). A opção do legislador é clara e não deixa espaço para prisão de ofício na fase pré-processual. A despeito de continuarmos a entender que descabe qualquer prisão de ofício (não importa se na fase pré-processual ou durante o processo), chama a atenção como se desconsidera a expressa disposição legal, em face da reiteração das práticas anteriores à reforma do CPP, justamente porque se dá de ombros à mudança normativa da expectativa de comportamento.

Em resumo, ainda que não se compreenda suficientemente o alcance da garantia da imparcialidade e da estrutura acusatória-constitucional, é certo que por força do art. 311 do CPP o juiz não pode “converter” o flagrante em prisão preventiva de ofício, pois isso é, no fundo, o mesmo que ‘decretar’ de ofício, expressamente vedado. Você pode nos indagar que os juízes do Brasil continuam prendendo, convertendo flagrantes sem que haja requerimento da autoridade policial ou do Ministério Público. De fato, a mentalidade inquisitória, tão bem trabalhada por Jacinto Nelson de Miranda Coutinho (semana próxima há evento em Curitiba discutindo a temática — aqui), ainda prevalece no imaginário da magistratura.

Entretanto, em pesquisa organizada por Flaviane Magalhães Barros e Leonardo Marinho (PUC/MG), começa-se a perceber a guinada democrática de parcela da magistratura, consoante se verifica da ementa do julgado Habeas Corpus Criminal No 1.0000.19.109874-8/000, relator Des. Flávio Batista Leite:

“HABEAS CORPUS – TRÁFICO DE DROGAS, CORRUPÇÃO ATIVA E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO – CONVERSÃO DA PRISÃO EM FLAGRANTE EM PREVENTIVA DE OFÍCIO NO CURSO DA INVESTIGAÇÃO CRIMINAL – VIOLAÇÃO AO ART. 311 DO CPP – CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO – NECESSIDADE DE REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA. De acordo com os artigos 282, § 2o, e 311 do Código de Processo Penal, com a nova redação dada pela Lei 12.403/2011, é defeso ao juiz decretar, de ofício, a prisão preventiva no curso da investigação policial. Se a prisão em flagrante foi convertida em preventiva na fase inquisitiva, sem requerimento do Ministério Público ou representação da autoridade policial, ela deve ser imediatamente revogada. V.V. Atendido ao menos um dos pressupostos do art. 312 do CPP, qual seja a garantia da ordem pública, bem como um dos requisitos instrumentais do art. 313 do CPP, deve ser a prisão preventiva mantida, não havendo que se falar em sua revogação, ou mesmo em substituição pelas medidas cautelares diversas da prisão previstas no art. 319 do CPP, pelo fato de estas se revelarem absolutamente insuficientes. A presença de condições subjetivas favoráveis ao paciente não obsta a segregação cautelar quanto presentes os fundamentos para justificar sua manutenção. Precedentes do STF e STJ”.

Assim é que, salvo quando houver declaração expressa da inconstitucionalidade do art. 311, do CPP, pela decisão que decretar de ofício a prisão preventiva, estaremos diante de franca violação normativa. Pode-se prender democraticamente respeitando-se os lugares específicos e as formas. Sem declarar formalmente inconstitucional o art. 311, do CPP, toda decisão que prende de ofício é ilegal. Mas a verdade é: o art. 311 é integralmente constitucional e fundamental para efetivação do sistema acusatório e, assim, criar as condições de possibilidade de um juiz imparcial. Afinal, cada um no seu quadrado, faz parte das regras do jogo. Talvez até a mais importante de todas as regras.

[1] LOPES Jr. Aury. Direito Processual Penal. 16ª edição. São Paulo, Ed. Saraiva, 2019, p. 618 e ss.. Consulte-se ainda: MORAIS DA ROSA, Alexandre. Guia do Processo Penal conforme a Teoria dos Jogos. 5ª Edição. EMais Editora & Livraria Jurídica, 2019.

Referências

Relacionados || Outros conteúdos desse assunto
    Mais artigos || Outros conteúdos desse tipo
      Alexandre Morais da Rosa || Mais conteúdos do expert
        Aury Lopes Jr || Mais conteúdos do expert
          Acesso Completo! || Tenha acesso aos conteúdos e ferramentas exclusivas

          Comunidade Criminal Player

          Elabore sua melhor defesa com apoio dos maiores nomes do Direito Criminal!

          Junte-se aos mais de 1.000 membros da maior comunidade digital de advocacia criminal no Brasil. Experimente o ecossistema que já transforma a prática de advogados em todo o país, com mais de 5.000 conteúdos estratégicos e ferramentas avançadas de IA.

          Converse com IAs treinadas nos acervos de Aury Lopes Jr, Alexandre Morais da Rosa, Rodrigo Faucz, Gabriel Bulhões, Cristiano Maronna e outros gigantes da área. Explore jurisprudência do STJ com busca inteligente, análise de ANPP, depoimentos e muito mais. Tudo com base em fontes reais e verificadas.

          Ferramentas Criminal Player

          Ferramentas de IA para estratégias defensivas avançadas

          • IAs dos Experts: Consulte as estratégias de Aury Lopes Jr, Alexandre Morais da Rosa, Rodrigo Faucz, Gabriel Bulhões e outros grandes nomes por meio de IAs treinadas em seus acervos
          • IAs de Jurisprudência: Busque precedentes com IAs semânticas em uma base exclusiva com mais de 200 mil acórdãos do STJ, filtrados por ministro relator ou tema
          • Ferramentas para criminalistas: Use IA para aplicar IRAC em decisões, interpretar depoimentos com CBCA e avaliar ANPP com precisão e rapidez
          Ferramentas Criminal Player

          Por que essas ferramentas da Criminal Player são diferentes?

          • GPT-4 com curadoria jurídica: Utilizamos IA de última geração, ajustada para respostas precisas, estratégicas e alinhadas à prática penal
          • Fontes verificadas e linkadas: Sempre que um precedente é citado, mostramos o link direto para a decisão original no site do tribunal. Transparência total, sem risco de alucinações
          • Base de conhecimento fechada: A IA responde apenas com conteúdos selecionados da Criminal Player, garantindo fidelidade à metodologia dos nossos especialistas
          • Respostas com visão estratégica: As interações são treinadas para seguir o raciocínio dos experts e adaptar-se à realidade do caso
          • Fácil de usar, rápido de aplicar: Acesso prático, linguagem clara e sem necessidade de dominar técnicas complexas de IA
          Comunidade Criminal Player

          Mais de 5.000 conteúdos para transformar sua atuação!

          • Curso Teoria dos Jogos e Processo Penal Estratégico: Com Alexandre Morais da Rosa e essencial para quem busca estratégia aplicada no processo penal
          • Curso Defesa em Alta Performance: Conteúdo do projeto Defesa Solidária, agora exclusivo na Criminal Player
          • Aulas ao vivo e gravadas toda semana: Com os maiores nomes do Direito Criminal e Processo Penal
          • Acervo com 130+ Experts: Aulas, artigos, vídeos, indicações de livros e materiais para todas as fases da defesa
          • IA de Conteúdos: Acesso a todo o acervo e sugestão de conteúdos relevantes para a sua necessidade
          Comunidade Criminal Player

          A força da maior comunidade digital para criminalistas

          • Ambiente de apoio real: Conecte-se com colegas em fóruns e grupos no WhatsApp para discutir casos, compartilhar estratégias e trocar experiências em tempo real
          • Eventos presenciais exclusivos: Participe de imersões, congressos e experiências ao lado de Aury Lopes Jr, Alexandre Morais da Rosa e outros grandes nomes do Direito
          • Benefícios para membros: Assinantes têm acesso antecipado, descontos e vantagens exclusivas nos eventos da comunidade

          Assine e tenha acesso completo!

          • 75+ ferramentas de IA para estratégias jurídicas com base em experts e jurisprudência real
          • Busca inteligente em precedentes e legislações, com links diretos para as fontes oficiais
          • Curso de Alexandre Morais da Rosa sobre Teoria dos Jogos e Processo Penal Estratégico
          • Curso Defesa em Alta Performance com Jader Marques, Kakay, Min. Rogério Schietti, Faucz e outros
          • 5.000+ conteúdos exclusivos com aulas ao vivo, aulas gravadas, grupos de estudo e muito mais
          • Fóruns e grupos no WhatsApp para discutir casos e trocar experiências com outros criminalistas
          • Condições especiais em eventos presenciais, imersões e congressos com grandes nomes do Direito
          Assinatura Criminal Player MensalAssinatura Criminal Player SemestralAssinatura Criminal Player Anual

          Para mais detalhes sobre os planos, fale com nosso atendimento.

          Quero testar antes

          Faça seu cadastro como visitante e teste GRÁTIS por 7 dias

          • Ferramentas de IA com experts e jurisprudência do STJ
          • Aulas ao vivo com grandes nomes do Direito Criminal
          • Acesso aos conteúdos abertos da comunidade

          Já sou visitante

          Se você já é visitante e quer experimentar GRÁTIS por 7 dias as ferramentas, solicite seu acesso.