Artigos Conjur – O desafio de qualificar a prática da investigação defensiva

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O desafio de qualificar a prática da investigação defensiva

O artigo aborda a importância da investigação defensiva como ferramenta essencial para garantir a paridade de armas e um julgamento justo no sistema penal. Os autores discutem a necessidade de qualificação dessa prática, destacando a responsabilidade do defensor em coletar e analisar provas que possam beneficiar o acusado, especialmente em um contexto onde a atuação do Estado pode ser dominante. Além disso, mencionam a recente publicação do Código Deontológico de Boas Práticas pela Abracrim, que visa estruturar normas éticas e práticas para a investigação defensiva, contribuindo para uma maior maturidade democrática no sistema judiciário.

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A nossa hipótese é a de que a qualificação da investigação defensiva, entendida como a atividade investigatória realizada sob a responsabilidade do defensor, com o objetivo de coletar, estruturar e analisar provas de interesse do investigado/acusado, tende a promover a paridade de armas, o julgamento justo (fair trial) e a mitigação dos erros de atribuição de responsabilidade penal, motivo pelo qual a publicação, pela Associação Brasileira da Advocacia Criminal (Abracrim), do Código Deontológico de Boas Práticas da Investigação Defensiva, orienta-se na consolidação da maturidade democrática do instrumento.

Embora a investigação preliminar esteja a cargo do Estado, admite-se a defensiva, até porque a finalidade da fase anterior ao processo é a de produzir material probatório e informativo capaz de colher todos os pontos de vista possíveis, a partir das regras democráticas, para o fim de justificar ou não a autoria, materialidade e culpabilidade, evitando erros de atribuição de responsabilidade penal (falsos positivos ou falsos negativos). Se o escopo dos procedimentos é a apuração na maior amplitude possível do evento histórico, a colaboração dos envolvidos no esclarecimento dos fatos deve se dar durante todas as etapas procedimentais. Além disso, diante dos espaços de acordo (ANPP, colaboração premiada etc.), ou a defesa investiga ou não terá chance de produzir nenhum elemento probatório nas etapas procedimentais antecedentes ao julgamento de mérito, uma vez que a produção da prova defensiva estará restrita à juntada de documentos, laudos, perícias ou prova oral quando da realização da audiência de instrução e julgamento (já na etapa do procedimento judicial).

A atribuição do lugar e função de acusação e de defesa pode sugerir, equivocadamente, o determinismo da postura passiva do investigado/acusado, própria do sistema inquisitório (sujeito ativo como mero objeto). Configura grave erro estratégico aguardar a produção de toda a prova pelo Estado para, então, iniciar-se a atividade defensiva. A situação se potencializa no ambiente de aceleração processual, espaços de consenso e por tecnologias 4.0. Por mais que as condições materiais sejam díspares, com ampla vantagem estatal, a proibição de investigação defensiva submete o investigado/acusado à boa vontade dos agentes públicos, dada a estreita hipótese do artigo 14, do CPP, “assistindo da arquibancada” o “desfile probatório” da acusação, em franca violação à paridade de armas.

A intervenção defensiva antes da AIJ é realidade em muitos países (não estamos inventando a roda) e tende a evitar ações penais sem suporte probatório, abusivas ou ainda o Erro do Tipo 1 (falso positivo). Na Justiça Negocial, a investigação defensiva aumenta a probabilidade de um melhor acordo ou mesmo do arquivamento. O diagnóstico e a intervenção precoce da Teoria do Caso Defensiva também auxiliam na identificação dos pontos fortes e fracos, evitando a instauração e/ou manutenção de ações penais sem fundamento (causa provável). No campo de investigações 4.0., com alto poder tecnológico, bem assim de casos de alta complexidade (megaprocessos), como aponta Diogo Malan, a antecipação defensiva é condição para que se possa ao menos confrontar a acusação, em flagrante vantagem competitiva (o Estado dispõe de meios, tempo e preparação, enquanto o exíguo prazo da resposta à acusação impede, em geral, a robustez dos meios de resistência). É que o palco da culpa deixou de ser somente a audiência de instrução e julgamento, para coadjuvar com a investigação preliminar, já que em boa parte dos casos o julgamento sequer ocorrerá (transação, ANPP, suspensão condicional, colaboração premiada etc.). A defesa não pode mais ficar observando a movimentação estatal desprovida de instrumentos de oposição imediata. O fator tempo será decisivo na mitigação de danos e/ou prejuízos (Luiz Eduardo Cani).

Diante da possibilidade de (a) ausência de recursos materiais (investigadores, peritos etc.); (b) excesso de apurações e atividades burocráticas por parte das polícias; (c) mentalidade inquisitória direcionada à coleta de elementos vinculados somente à responsabilização; (d) reduzida eficácia dos pedidos defensivos na etapa de investigação criminal, a teor do artigo 14 do CPP (O ofendido, ou seu representante legal, e o indiciado poderão requerer qualquer diligência, que será realizada, ou não, a juízo da autoridade) e, (e) ausência de paridade de armas para o fim de garantir as mesmas oportunidades, assim como em diversos outros países, o Conselho Federal da OAB editou o Provimento 188/2018, consolidando a orientação sobre a autorização da investigação defensiva.

Segue-se que o dever de investigar defensivo é urgente e precisa ser efetivado por meio de profissionais qualificados, treinados e cientes das salvaguardas necessárias ao bom desempenho da atividade, evitando a violação de normas de garantia e práticas de ilicitudes. Saber antecipar as oportunidades probatórias inerentes à investigação defensiva demanda a superação da lógica cronológica, adotando-se diligências aptas à preservação e à garantia do acervo probatório aderente à realidade fática (p.ex., câmeras de segurança do local do evento). Para tanto, os defensores precisam consolidar novas ferramentas e habilidades, incorporando ações e estratégias dotadas de flexibilidade operacional, atualização tecnológica e conformidade normativa.

A tendência democrática à paridade de armas (STF, HC, 83.255) sustenta que a defesa está autorizada a inventariar e a investigar os elementos materiais e testemunhais relevantes para o exercício pleno da ampla defesa, evitando a instauração da ação penal por ausência de “causa provável”, interferentes na decisão sobre a absolvição sumária e/ou fornecendo elementos aptos a suportar decisões frente aos instrumentos da justiça penal negociada. A abertura para o uso da investigação defensiva trouxe consigo não apenas a possibilidade de a defesa produzir elementos favoráveis como também de escrutinar a cadeia de custódia das provas (analógica ou digital), avaliar seu conteúdo e demonstrar o uso abusivo da investigação seletiva (pro acusação, exclusivamente). A efetivação da paridade de armas mitiga o efeito das investigações enviesadas ou alinhadas ao propósito exclusivo da acusação, despertando nos defensores a função de buscar novas habilidades e instrumentos capazes de melhorar o desempenho. Entretanto, a função da investigação defensiva não é a de substituir os agentes estatais, nem a de realizar atos de qualquer maneira, ou seja, o amadorismo deve ser afastado. Existem regras de conformidade, motivo pelo qual se defende o compliance da investigação defensiva.

Neste sentido, existem iniciativas promissoras e qualificadas. Por exemplo, a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro estruturou o Núcleo de Investigação Defensiva e, mais recentemente, a Defensoria Pública de Mato Grosso, publicou a Portaria nº 1.165/2022/DPG, instituindo comissão para o estudo da criação e normatização do Núcleo especializado na Investigação Criminal Defensiva, atuação em interrogatórios, inquéritos policiais e junto ao Núcleo de Inquéritos Policiais do Poder Judiciário de Mato Grosso. A margem de atuação, já se sabe, está inserida no espectro da ampla defesa, da paridade de armas, das ações neutras e do sigilo do defensor, mas a questão sensível ainda é a produção a partir de regras e procedimentos aceitos científica, normativa e eticamente.

Atenta a essa questão, a Comissão de Investigação Defensiva e Novas Tecnologias da Abracrim (apoiada pelos gestores Elias Mattar Saad, Sheyner Asfora), composta por Gabriel Bulhões (presidente), Michelle Aguiar (vice-presidente) e Rodrigo Camargo (secretário-geral), está lançando nesta sexta-feira (23/9) em meio ao 11º Encontro Brasileiro da Advocacia Criminal (Ebac), realizado na cidade Florianópolis (SC), o Código Deontológico de Boas Práticas da Investigação Defensiva, instrumento elaborado por 24 profissionais de diversas áreas do Direito (Peritos, Professores, Advogados e Defensores Públicos). A publicação se orienta pelo reconhecimento da necessidade da estruturação de normas de conduta ético-profissionais para o exercício da atividade, propondo parâmetros de atuação com a finalidade de auxiliar as ações próprias da investigação defensiva. A versão impressa, com tiragem inicial prevista em 1.000 exemplares, será distribuída a todos os participantes do encontro, além de ser enviada aos demais players do Processo Penal. A iniciativa que promete ser um marco dessa matéria no Brasil.

Em consequência, ao mesmo tempo em que se aponta para o dever de investigar defensivo (duty to investigate), também se indica a necessidade de observância de normas éticas, técnicas e normativas associadas à função defensiva, evitando a violação das diretrizes de conduta de modo doloso ou culposo. É que o desconhecimento sobre os limites e possibilidades pode gerar a ilicitude do material coletado, além de responsabilização pessoal do defensor. Assumir novas funções está associado ao reconhecimento das limitações circunstanciais, normativas e éticas, com a disposição ativa de se adquirir novas habilidades e dominar as ferramentas disponíveis, mantido o dever de conformidade. Vale destacar as funcionalidades da Plataforma da Ethos Brasil, cujo escopo é o de conferir validade jurídica ao produto da investigação defensiva.

Assim como uma prova acusatória obtida de modo ilícito é irrelevante para a atribuição da responsabilidade penal, a ausência de cuidados defensivos na obtenção, na aquisição e na apresentação do produto da investigação defensiva, pode invalidar o esforço defensivo. Por isso, a atividade orientar-se por meio de boas práticas de investigação defensiva, razão pela qual o Código Deontológico deve ser consultado, estudado e observado. É mais um passo à democratização do Processo Penal brasileiro.

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