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Não é preciso gritar para se fazer ouvir no jogo processual

O artigo aborda a importância da argumentação eficaz no processo judicial, destacando que não é necessário o uso de gritos ou ataques diretos para ser ouvido pelos juízes e tribunais. O autor, Alexandre Morais da Rosa, enfatiza que o sucesso no jogo processual depende de uma lógica argumentativa estratégica que considere tanto as normas jurídicas quanto os aspectos cognitivos e contextuais envolvidos na decisão. Além disso, a capacidade de reconhecer e relativizar os argumentos do adversário é fundamental para construir uma narrativa convincente.

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A pretensão é a de convencer o auditório (juiz ou Tribunal), a partir de recursos lógico-formais-pragmáticos na e pela linguagem, de que a melhor compreensão do caso é a apresentada. Essa articulação, todavia, não se restringe aos aspectos jurídicos, dado que a compreensão também dialoga com mecanismos de cognição, psicológicos, sociológicos, dentre outros. A ampliação da argumentação jurídica, portanto, pode ser um dos caminhos para melhor compreensão do resultado. Isso significa que a lógica formal será necessária, mas não suficiente para o êxito. A antecipação dos possíveis contra-argumentos mostra-se como necessária. Vigora a plena dinamicidade argumentativa.

Por mais que acolha o modelo hermenêutico, a ampla maioria dos juristas opera com base na lógica da argumentação jurídica de viés analítico. Daí que é importante uma breve apresentação, sem que possa aprofundar a temática nos limites deste texto. Mas há vasta bibliografia para essa finalidade[3]. O que importa demonstrar é a relevância da temática para que se possa jogar de maneira mais consolidada nos jogos processuais.

Não se trata de mero debate, mas de cadeias de argumentação em que há objetivo por parte dos jogadores e uma pontuação pelo julgador, capaz de atribuir o sentido da produção probatória e da imputação no ato decisório. Para que a argumentação possa operar é necessário compreender o mapa mental dos jogadores e o contexto da decisão. As consequências e inferências serão de fundamental importância para o êxito das táticas e estratégias[4].

O processo penal será o palco em que os argumentos travarão a batalha[5]. Importante, no contexto, a distinção formulada por Peczenik[6] entre o sentido da norma “prima facie” e “tendo tudo em conta”, ou seja, em que a percepção universal do sentido ganha novos matizes no contexto de uma singularidade. Já sublinhei a importância dos contextos e no caso da distinção operada por Peczenik podemos autorizar que a compreensão “prima facie” somente ganha operatividade em um contexto situado no tempo[7], no espaço, e com seus jogadores determinados, que será o ponto inicial do sentido que advirá no processo argumentativo. Os pontos de partida dos jogadores podem ou não ser compartilhados, instaurando-se, a partir de então, alternativas de sentido, ambos — muitas vezes — justificados legalmente. Talvez se possa defender um sentido “prima facie” de textos normativos, mas será somente no contexto real de um jogo que o sentido transitará em julgado, embora a expectativa seja a prevalência do modelo acolhido pelos intérpretes autorizados do senso comum teórico dos juristas (Warat).

Ao invés de simplesmente negar os argumentos do adversário, de modo geral, a tática mostra-se inviável se a pretensão for a de o convencer. É que o enfrentamento (choque de versões) coloca o lugar de antagonista. Assim é que a reconstrução lógica do argumento do adversário, em cadeias de argumentação, mostra-se como necessária para sua relativização. Pode-se, com esse modo de articulação, caminhar-se junto e, no ponto em que há divergência, sublinhar a dissonância. Desconsiderar toda sua argumentação é uma tática equivocada.

Por exemplo, em caso de roubo, em que a tese defensiva seja a negativa de autoria, o caminhar argumentativo pode se postar somente na ausência de provas da autoria. Mas, talvez, reconhecer que o crime existiu, que há prova de que aconteceu, bem assim de que havia elementos mínimos para propositura da ação penal, mas que restaram arredados exclusivamente no tocante à autoria pelos argumentos x e y. Isso porque ao aceitarmos o desafio antecedente de “ver” o mundo como o adversário “pinta”, o convidamos a “ver” o mundo conforme nossos “olhos”, dando ensejo ao reconhecimento empático de similitude racional.

Esse último modelo argumentativo faz com o argumento final seja ouvido pelo adversário, não implica em descrédito, com a possibilidade maior de êxito. Aparenta que compreendemos e reconhecemos a sua forma de pensar, com as divergências tópicas que nos implicam em outra conclusão. Claro que o contexto do jogo ganha relevância. O detalhe de como se diz as mesmas coisas pode fazer toda a diferença. Não significa que, necessariamente, o jogador adversário terá “ouvidos” para nossos argumentos, mas sabemos que em alguns casos podemos pelo menos nos fazer ouvir. Reside na dificuldade em se escutar um dos maiores desafios da argumentação jurídica, posta de maneira selvagem. Somente assim se pode abrir ensejo de “capitulação” e êxito da estratégia.

[1] MORAIS DA ROSA, Alexandre. Guia Compacto do Processo Penal conforme a Teoria dos Jogos. Florianópolis: Empório do Direito, 2016. [2] VATTIMO, Giani. Enciclopedia Garzanti di Filosofia. Milán, 1993, p. 54; RODRÍGUEZ, Victor Gabriel. Argumentação jurídica: técnicas de persuasão e lógica informal. 4. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2005, p. 13; RODRÍGUEZ, Victor Gabriel. Argumentação jurídica: técnicas de persuasão e lógica informal. 4. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2005, p. 13; MACCORMICK, Neil. Retórica e Estado de Direito. Tradução Conrado Hübner Mendes. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008, p. 19; VOESE, Ingo. Um estudo da argumentação jurídica. Curitiba: Juruá, 2001, p. 29; ATIENZA, Manuel. As razões do direito: teoria da argumentação jurídica. Tradução Maria Cristina Guimarães Cupertino. – 2.ed. – Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2014, p. 33. [3] ATIENZA, Manuel. As razões do direito: teoria da argumentação jurídica. Tradução Maria Cristina Guimarães Cupertino. – 2.ed. – Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2014; HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre facticidade e validade. Trad. Flávio Siebeneicher. Rio de Janeiro: BTU, v. 1, 2010; BRITTO, Cláudia Aguiar Silva. Processo Penal Comunicativo: comunicação processual à luz da filosofia de Jürgen Habermas. Curitiba: Juruá, 2014; GÜNTER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad. Claudio Molz. Rio de Janeiro: Forense, 2011; PERELMAN, Chaïm. Tratado de Argumentação. Trad. Maria Ermantina Galvão. São Paulo: Martins Fontes, 2002; HOLMES JR, Oliver Wendell. La senda del derecho. Trad. José Ignacio Solar Cayón. Madrid: Marcial Pons, 2012; REDONDO, María Cristina; SUCA, José María; IBÁÑEZ, Perfecto Andrés. Estado de Derecho y Decisiones Judiciales. Madrid: Fundación Coloqui Jurídico Europeo, 2009; LAPORTA, Francisco J; MANERO, Juan Ruiz; RODILLA, Miguel Ángel. Certeza y precedcibilidad de las relaciones jurídicas. Madrid: Fundación Coloqui Jurídico Europeo, 2009; MORESO, José Juan; PRIETO SACHÍS, Luis; FERRER BELTRÁN, Jordi. Los desacuerdos em el Derecho. Madrid: Fundación Coloqui Jurídico Europeo, 2010; AARNO, Aulis; ATIENZA, Manuel; LAPORTA, Francisco J. Bases teóricas de la interpretación jurídica. Madrid: Fundación Coloqui Jurídico Europeo, 2010; BULYGIN, Eugenio; ATIENZA, Manuel; BAYÓN, Juan Carlos. Problemas lógicos em la teoría y práctica del Derecho. Madrid: Fundación Coloqui Jurídico Europeo, 2009. [4] RAPOPORT, Anatol. Lutas, Jogos e Debates. Trad. Sérgio Duarte. Brasília: UNB, 1998, p. 207: “Aqui devemos assinalar a diferença entre debate e argumentação. Se tento convencer ou desconvencer alguém apresentando fatos ou chamando atenção para cadeias de consequências lógicas, estou argumentando. O sucesso da argumentação depende de que os fatos sejam examinados e de que a cadeia de consequências lógicas seja verificada”. [5] BRITTO, Cláudia Aguiar Silva. Processo Penal Comunicativo: Comunicação Processual à luz da filosofia de Jürgen Habermas. Curitiba: Juruá, 2014. [6] PECZENIK, Aleksander. On Law and Reason. Springer Science+Bussines Media Dorderech, 1989, p. 114 e ss. [7] AARNIO, Aulis. Una única respuesta correcta? In: AARNO, Aulis; ATIENZA, Manuel; LAPORTA, Francisco J. Bases teóricas de la interpretación jurídica. Madrid: Fundación Coloqui Jurídico Europeo, 2010, p. 9-45.

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