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Juízes fazem piquetes contra alegações finais nos processos?

O artigo aborda a relevância das alegações finais nos processos criminais, questionando se elas são realmente necessárias ou se são apenas um formalismo. O autor argumenta que, na busca por eficiência, muitos juízes parecem desvalorizar o papel dessas alegações, o que pode ameaçar o contraditório e a legitimidade do processo judicial. Além disso, destaca a necessidade de uma reflexão crítica sobre a prática processual atual e a influência das partes na formação da decisão, propondo uma revisão das concepções tradicionais sobre o papel do juiz e das alegações finais.

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De um lado a magistrada deve estar interessada justificadamente no aumento da prestação jurisdicional. E, com isso, mostra-se necessário fazer milagres. Aliás, a angústia da magistratura por números e eficiência é um problema a ser enfrentado. A pretensão de realizar somente a oitiva das testemunhas e depois se ausentar da sala bem demonstra a sua maneira de pensar, ou seja, de que as alegações finais não compõem o ato decisório. Não quero complicar, nem ser desrespeitoso, por favor. Na junção da Teoria da Relação Jurídica de Bullow, imensamente importante no seu momento histórico, acrescida da máxima de que os fatos seriam obrigação das partes e o juiz daria o direito (da mihi factum, dabo tibi ius), resolve os casos penais. Acoplamento perfeito. O juiz conhece o Direito. Logo, nessa lógica, não há muito sentido nas alegações finais, afinal de contas, os fatos já foram estabelecidos após a finalização da instrução. O modelo de pensar conforme a relação jurídica encontra grande respaldo no ambiente forense. É ensinado em todas as Faculdades de Direito e os livros de Teoria Geral do Processo, de regra, apresentam como sendo a nossa Teoria de Processo. Daí a crença difundida de que o magistrado estaria no topo da pirâmide, acima das partes.

Alguns autores começaram a demonstrar que é impossível separar os fatos do Direito e que as pretensões de validade sugeridas pelas partes devem ser consideradas, até mesmo porque o artigo 385 do Código de Processo Penal, para nós, não foi recepcionado. Acreditamos que o magistrado, no processo penal, já se demitiu da noção medieval de Verdade Real e busca o acertamento do caso penal, tendo o acusador a carga probatória respectiva. Daí que mesmo o juiz se convencendo da culpa, não poderia condenar quando a acusação requeresse a absolvição. Entretanto, congregando em si os referenciais da Verdade — o que o magistrado entender que é, no seu “livre e motivado convencimento” — e separando as funções, a saber, às partes os fatos e ao magistrado o Direito, a partir desse mapa mental, por certo, as alegações são irrelevantes.

A Escola Mineira de Processo (Rosemiro Pereira Leal, Aroldo Plínio Gonçalves, Marcelo Cattoni, André Leal, Leonardo Marinho e Flaviane Barros, dentre outros) procura ler o processo a partir da noção de procedimento em contraditório (Fazzalari). A exteriorização do princípio do contraditório, na proposta de Fazzalari, dá-se em dois momentos. Primeiro com a informazione, consistente no dever de informação para que possam ser exercidas as posições jurídicas em face das normas processuais e, num segundo momento, a reazione, manifestada pela possibilidade de movimento processual, incluídas as alegações finais, momento em que os jogadores poderão expor suas pretensões de validade, como aponta também Claudia Aguiar Britto. Logo, o processo penal possui destacado lugar e função na democracia: é o espaço de diálogo em que o contraditório deve ser garantido. É a partir do contraditório que se estabelece a legitimidade do provimento judicial. Claro que o conteúdo da decisão estará vinculado a outros fatores, dado que inexiste decisão neutra. Há sempre a aderência — mesmo alienada — a um modelo ideológico de pensar. O que importa é (re)estabelecer um espaço democrático no processo penal brasileiro, superando a visão prevalecente, na qual o ritual e a postura inquisitória ceifam qualquer possibilidade de democracia processual, no que Fazzalari pode ser um sendero, pelo menos do ponto de vista da produção de informação processual válida e apta a justificar as decisões. Rui Cunha Martins chama de “amor ao contraditório”.

Para os que pensam na matriz do contraditório a decisão judicial é um ato complexo que não começa com o “Vistos, etc.”. Superada a fase de produção probatória, inicia-se com as alegações finais do Ministério Público, cujo protagonismo é rebaixado pela noção de que da mihi factum, dabo tibi ius, bem assim com as razões defensivas. Somente depois, apontadas as pretensões de validade, surge o magistrado para estabelecer o sentido da prova com o Direito aplicável, naquilo de José Calvo Gonzalez chama de coerência narrativa (El discurso de los hechos). Aliás, no Novo CPC existe disposição expressa, superando em parte a visão superior do magistrado, pela qual não se poderá invocar fundamento da decisão diverso do que for trazido pelas partes, as quais fixarão os limites dos argumentos. Fica vedado o argumento surpresa. Novos tempos se aproximam, assim como a resistência de quem está acostumado a pensar sempre do mesmo jeito, embora com gap democrático.

Fico imaginando nos processos administrativos contra magistrados, quer no âmbito do CNJ ou do Órgão Especial, como seria um julgamento de processo administrativo ou criminal (só nos tribunais, claro), em que um solicitasse a palavra, antes das razões finais, para condenar o magistrado? Talvez aí percebamos a importância das alegações finais como a possibilidade, efetiva, de que o amor pelo contraditório possa adentrar no ambiente processual brasileiro.

Levando-se ao extremo a ausência de importância das alegações finais, seria conveniente acabarmos com elas, uma vez que tomam tempo e pauta, passando-se diretamente à decisão. Por fim, ainda, caso a defesa concorde com a acusação e requeira a condenação, em diversos julgados, anula-se a decisão condenatória por ausência de defesa. Mas se as alegações finais são irrelevantes, por qual motivo se anula? Nos casos em que a defesa preliminar se reserva para alegações finais e não são sequer escutadas, há mesmo defesa ou mero procedimento performático? De fato, há um curto-circuito entre o direito de defesa, a noção de contraditório e de devido processo legal. Das duas uma: ou se extinguem as alegações finais ou são levadas a sério.

Isso demonstra a importância de repensarmos a teoria do processo, já que as funções de cada um dos jogadores e julgadores processuais se modifica. A imensa maioria dos juristas foi forjada pela noção de da mihi factum, dabo tibi ius, a qual não se sustenta teoricamente, embora seja amplamente utilizada. É tempo de se atualizar, mesmo que saindo da zona de conforto.

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