Artigos Empório do Direito – Efeito csi – crime scene investigation – no processo penal ostentação

Artigos Empório do Direito
Artigos Empório do Direito || Efeito csi – crime scene in…Início / Conteúdos / Artigos / Empório do Direito
Artigo || Artigos no Empório do Direito

Efeito csi – crime scene investigation – no processo penal ostentação

O artigo aborda a influência da mídia, especialmente programas de televisão como “Crime Scene Investigation”, no processo penal e na formação do imaginário social sobre criminalidade. O texto discute os efeitos da ostentação e da cultura do medo, ressaltando como esses programas moldam a expectativa da população e impactam os julgamentos, criando uma presunção de culpabilidade e enfraquecendo garantias processuais. A análise destaca o papel da imprensa na construção de narrativas e sua relação com a justiça, levando a uma pressão crescente por punições, mesmo diante da falta de provas concretas.

Artigo no Empório do Direito

Por Alexandre Morais da Rosa – 25/06/2015

Até que ponto o imaginário forense é influenciado pelos Programas de Televisão? O impacto da mídia nas decisões judiciais é tema recorrente no noticiário, principalmente porque vivemos o Processo Penal do Espetáculo, nos dizeres de Rubens Casara (aqui), seguindo a linha de Debord. Na sociedade da ostentação, em que não basta fazer, pois é preciso se exibir, quer em noticiários, quer nas redes sociais, ver e ser visto passou a ser o sintoma de toda uma geração. E os efeitos narcísicos da ostentação das prisões, da apresentação dos conduzidos como “caça”, enxovalhando a reputação e dignidade, transpassam os limites da informação. Os programas “escorre sangue” querem vender patrocínio e quanto mais violento o crime, bem assim se puder dar um rosto ao criminoso, maior a audiência. E as imagens invadem os Tribunais, contaminando, muitas vezes, a prova testemunhal.

Daí que se pode estudar os efeitos de programas policias na compreensão do fenômeno criminal. Embora seja passada somente na TV paga, a série Crime Scene Investigation – CSI está no ar desde o ano de 2000, com cinco seriados semanais e mais de 25 milhões de espectadores semanais, merece destaque. No Brasil já se produziu, dentre outros, o Linha Direta. Em todos eles a temática são os crimes bárbaros que, por não envolverem disputa, pois ao invés de dividir – todos querem Justiça! – formarão consenso sobre a pena, e interessarão à população jogada na lógica da vingança, podendo ocasionar mobilizações em prol do único remédio conhecido – por eles – para conter a ‘chaga do crime’: cadeia neles!; se possível linchamento em praça pública, com hora marcada, fogueira, enxofre, muito sangue e patrocinadores a peso de ouro, retomando-se o suplício do corpo dos condenados (aqui).

A exploração do medo decorrente do crime violento passa a ser o mote de políticos e da mídia ‘sangue-show’, os quais são conduzidos por jornalistas que se submetem às expectativas mais primitivas do humano, indicadas por Juvenal: pão e circo. A fascinação pela barbárie encontra na mídia delivery seu melhor canal para o embrutecimento humano, sua servidão voluntária (La Boétie). Nestes casos, surgem sempre os fast-thinkers capazes de emitir comentários pseudo-científicos, sem qualquer análise mais detida dos fatos, armando-se (esse é o termo), ao depois, debates verdadeiramente falsos ou falsamente verdadeiros (Bourdieu) nos quais a encenação é patética e o resultado conhecido de antemão. Afinal, o patrocinador não pode ter sua imagem prejudicada. A ‘moral vedete’ surge nos discursos moralizantes e normatizadores, enunciados pelos Juízes Midiáticos, nos quais as garantias penais e processuais são francamente vilipendiadas.

Estes discursos midiáticos, por certo, influenciam no julgamento e não podem ingenuamente ser deixados de lado, uma vez que superamos o modelo trial by media em favor do julgamento pela mídia. Dentre os programas escorre sangue, um deles merece destaque por sua estética, a qual mescla fatos com ficção (jornalismo + novela) e além de inevitavelmente condenar os acusados – com presunção de inocência –, gera efeitos nefastos no mundo da vida: ‘Linha Direta’, o qual terminava invariavelmente com a condenação antecipada e a convocação dos telespectadores para assumir a condição de delatores. Kleber Mendonça procedeu instigante reflexão sobre o programa, deixando evidenciado que em termos de índice de audiência, a montagem é perfeita, gera lucro com sobras, ao custo das garantias democráticas. Mas quem se importa? Muito poucos, de regra, taxados ingenuamente de defensores de bandidos. Dentro da lógica da Defesa Social, o programa se enquadra perfeitamente, dado que possibilita achar que o vizinho ou o garoto da esquina são o ‘bandido fugitivo’ e quando, enfim, ele é preso, respira-se aliviado: ‘menos um malvado solto’. Em tempos de cinismo absoluto, especial enfoque se dá aos desvios sexuais, com a caça aos respectivos delinquentes. Nos EUA são o alvo privilegiado da imprensa, principalmente depois da Lei de Megan, a qual divulga a lista dos agressores sexuais, os quais jamais se livram da pena, pois (aqui). Tudo sob o pretexto de moralizar a sociedade e manter em segurança os bons diante dos criminosos, claro. A mídia apresenta programação palpitante sobre os ‘criminosos’, com direito a ‘fotos’, perguntas abusivas, etc.

Daí ganhar importância as séries criminais. Há um canal específico para eles na televisão paga. E, dentre eles, o Crime Scene Investigation importa para o fomento da cultura do medo (Bizzoto), conforme apontou Monique Woytuski em excelente monografia defendida na UFSC. O CSI mistura ficção científica com provas periciais, fomentando a fé na sua infalibilidade, com a invocação da ausência dessas provas para fins de absolvição ou condenação. Muitas dos termos utilizados não estão à disposição da perícia forense, bem assim alguns sequer existem, sendo invenção midiática (Zulmar Coutinho).

A situação americana mereceu estudo de diversos pesquisadores. Andrew Thomas afirma que jurados de Maricopa indagam pela ausência de impressões digitais, DNA mitocondrial, balística, mesmo quando o caso penal não indicava a necessidade. Tamara Lawson sustenta, por sua vez, que a exigência de evidências materiais auxilia na obtenção mais adequada da prova processual penal. Já para Tom Tyler a audiência do programa auxilia nas condenações porque incitam a necessidade de punição, apostam excessivamente na ciência e criam visão unilateral da lei. Kimberliane Podlas, entretanto, conclui que o programa não faz diferença no veredicto. Donald Shelton defende que o desenvolvimento tecnológico da vida real, materializado pelo CSI, nada mais é do que seu reflexo no processo penal. Todos, contudo, ao estudarem o fenômeno reconhecem o impacto da mídia nos julgamentos criminais.

No Brasil a realidade dos Institutos de Perícias é sofrível, sem material humano e tecnológico. A prova pericial, muitas vezes exigida pela lei para configuração do tipo é substituída pela prova testemunhal ou indireta, desconsiderando-se a exigência material. Entretanto, a ausência de condições materiais não pode ser fundamento para exclusão da prova pericial, até porque não é obrigação do acusado. A ausência de produção de provas pelo Estado, quando possível, implica na invocação da Teoria da Perda de uma Chance no Processo Penal (aqui).

Resultado disso é o fomento da ‘cultura do medo’, com a mitigação do senso crítico, vendo-se no outro qualquer o ódio estampado pela sensação de nirvana somente existente antes do nascimento, mas que se busca com uma compulsão assustadora. Mesmo sem nunca se ter tido a ‘paz’ almejada, fala-se de um tempo perdido de segurança, facilitando-se discursivamente, pelas emoções, a prevalência de discursos de opressão social, tudo em nome da contenção da escalada avassaladora da criminalidade. O clima de insegurança atende aos anseios políticos de manutenção do status quo, sempre afirmando-se a ocorrência de violência, mas sem nunca resolvê-lo, ocupando matreiramente o tempo dos sujeitos que se encontram, pois, eclipsados do que importa numa sociedade democrática.

O que importa destacar, todavia, com especial relevo no Júri, composto pela classe média, que assiste TV paga, bem apontou Lenio Streck (aqui), é que o impacto e pressão dos programas policiais – jornalísticos ou de ficção – cada vez mais precisa ser estudado e problematizado, dado que são uma variável a ser explorada, dada a atmosfera do medo. Os limites do Imaginário deslizam no Processo Penal Ostentação e cada vez mais o “Efeito CSI” opera em nossos julgamentos, para os dois lados. Quem não conhece perde.

Livros Publicados pelo autor na Editora Empório do Direito. Confira: Compre os livros do autor aqui.

Alexandre Morais da Rosa é Professor de Processo Penal da UFSC e do Curso de Direito da UNIVALI-SC (mestrado e doutorado). Doutor em Direito (UFPR). Membro do Núcleo de Direito e Psicanálise da UFPR. Juiz de Direito (TJSC). Email: [email protected] Facebook aqui

Imagem Ilustrativa do Post: CSI: Crime Scene Investigation on Living TV // Foto de: Ben Sutherland // Sem alterações Disponível em: https://www.flickr.com/photos/bensutherland/343969995/in/photolist-woWia-f4oyZE-f4ozcW-5HKQg9-6mjunr-59eq8r-7GMyU9-5qGgp4 Licença de uso: http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/legalcode

Referências

Relacionados || Outros conteúdos desse assunto
    Mais artigos || Outros conteúdos desse tipo
      Alexandre Morais da Rosa || Mais conteúdos do expert
        Acesso Completo! || Tenha acesso aos conteúdos e ferramentas exclusivas

        Comunidade Criminal Player

        Elabore sua melhor defesa com apoio dos maiores nomes do Direito Criminal!

        Junte-se aos mais de 1.000 membros da maior comunidade digital de advocacia criminal no Brasil. Experimente o ecossistema que já transforma a prática de advogados em todo o país, com mais de 5.000 conteúdos estratégicos e ferramentas avançadas de IA.

        Converse com IAs treinadas nos acervos de Aury Lopes Jr, Alexandre Morais da Rosa, Rodrigo Faucz, Gabriel Bulhões, Cristiano Maronna e outros gigantes da área. Explore jurisprudência do STJ com busca inteligente, análise de ANPP, depoimentos e muito mais. Tudo com base em fontes reais e verificadas.

        Ferramentas Criminal Player

        Ferramentas de IA para estratégias defensivas avançadas

        • IAs dos Experts: Consulte as estratégias de Aury Lopes Jr, Alexandre Morais da Rosa, Rodrigo Faucz, Gabriel Bulhões e outros grandes nomes por meio de IAs treinadas em seus acervos
        • IAs de Jurisprudência: Busque precedentes com IAs semânticas em uma base exclusiva com mais de 200 mil acórdãos do STJ, filtrados por ministro relator ou tema
        • Ferramentas para criminalistas: Use IA para aplicar IRAC em decisões, interpretar depoimentos com CBCA e avaliar ANPP com precisão e rapidez
        Ferramentas Criminal Player

        Por que essas ferramentas da Criminal Player são diferentes?

        • GPT-4 com curadoria jurídica: Utilizamos IA de última geração, ajustada para respostas precisas, estratégicas e alinhadas à prática penal
        • Fontes verificadas e linkadas: Sempre que um precedente é citado, mostramos o link direto para a decisão original no site do tribunal. Transparência total, sem risco de alucinações
        • Base de conhecimento fechada: A IA responde apenas com conteúdos selecionados da Criminal Player, garantindo fidelidade à metodologia dos nossos especialistas
        • Respostas com visão estratégica: As interações são treinadas para seguir o raciocínio dos experts e adaptar-se à realidade do caso
        • Fácil de usar, rápido de aplicar: Acesso prático, linguagem clara e sem necessidade de dominar técnicas complexas de IA
        Comunidade Criminal Player

        Mais de 5.000 conteúdos para transformar sua atuação!

        • Curso Teoria dos Jogos e Processo Penal Estratégico: Com Alexandre Morais da Rosa e essencial para quem busca estratégia aplicada no processo penal
        • Curso Defesa em Alta Performance: Conteúdo do projeto Defesa Solidária, agora exclusivo na Criminal Player
        • Aulas ao vivo e gravadas toda semana: Com os maiores nomes do Direito Criminal e Processo Penal
        • Acervo com 130+ Experts: Aulas, artigos, vídeos, indicações de livros e materiais para todas as fases da defesa
        • IA de Conteúdos: Acesso a todo o acervo e sugestão de conteúdos relevantes para a sua necessidade
        Comunidade Criminal Player

        A força da maior comunidade digital para criminalistas

        • Ambiente de apoio real: Conecte-se com colegas em fóruns e grupos no WhatsApp para discutir casos, compartilhar estratégias e trocar experiências em tempo real
        • Eventos presenciais exclusivos: Participe de imersões, congressos e experiências ao lado de Aury Lopes Jr, Alexandre Morais da Rosa e outros grandes nomes do Direito
        • Benefícios para membros: Assinantes têm acesso antecipado, descontos e vantagens exclusivas nos eventos da comunidade

        Assine e tenha acesso completo!

        • 75+ ferramentas de IA para estratégias jurídicas com base em experts e jurisprudência real
        • Busca inteligente em precedentes e legislações, com links diretos para as fontes oficiais
        • Curso de Alexandre Morais da Rosa sobre Teoria dos Jogos e Processo Penal Estratégico
        • Curso Defesa em Alta Performance com Jader Marques, Kakay, Min. Rogério Schietti, Faucz e outros
        • 5.000+ conteúdos exclusivos com aulas ao vivo, aulas gravadas, grupos de estudo e muito mais
        • Fóruns e grupos no WhatsApp para discutir casos e trocar experiências com outros criminalistas
        • Condições especiais em eventos presenciais, imersões e congressos com grandes nomes do Direito
        Assinatura Criminal Player MensalAssinatura Criminal Player SemestralAssinatura Criminal Player Anual

        Para mais detalhes sobre os planos, fale com nosso atendimento.

        Quero testar antes

        Faça seu cadastro como visitante e teste GRÁTIS por 7 dias

        • Ferramentas de IA com experts e jurisprudência do STJ
        • Aulas ao vivo com grandes nomes do Direito Criminal
        • Acesso aos conteúdos abertos da comunidade

        Já sou visitante

        Se você já é visitante e quer experimentar GRÁTIS por 7 dias as ferramentas, solicite seu acesso.