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Juiz não deveria ser xerife nem detetive em busca da verdade real

O artigo aborda a necessidade de repensar a noção de prova no Processo Penal à luz da Teoria da Informação, destacando a importância da parcialidade e fragmentariedade do conhecimento obtido através das interações processuais. Os autores argumentam que a figura do juiz não deve se assemelhar a um “xerife” em busca da verdade real, mas sim atuar de forma crítica, reconhecendo as limitações das informações disponíveis. Ao longo do texto, enfatiza-se a construção narrativa do processo penal e a importância de compreender as dinâmicas de atuação dos agentes, em um contexto onde a busca por uma verdade única é considerada uma armadilha cognitiva.

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Você sabe o que é taxa de informação no Processo Penal? Precisamos, então, alterar a noção de prova para incorporarmos a Teoria da Informação (Shannon e Weaver), especialmente porque as informações dependem de um mecanismo alocativo processual, em que o requerimento, deferimento, produção e valoração são dinâmicos e dependem de fatores singulares, como já defendemos no livro A Teoria dos Jogos Aplicada ao Processo Penal (Rei dos Livros/Empório do Direito, 2015). Partimos, assim, da premissa de que não podemos ter conhecimento completo e que a parcialidade da informação é condição de enfrentamento da teoria da decisão no processo penal.

Surge, pois, a discussão sobre a “economia informacional do Processo Penal”, pela qual se pode discutir o caráter fragmentário e parcial do conhecimento trazido ao processo, a depender das atitudes dos agentes processuais (magistrado, Ministério Público, defensor/advogado e acusado), suas respectivas funções e lugares.

Claro que para assumir esta postura será necessário superar o essencialismo, pois descrentes da possibilidade de se conhecer todos os dados particulares de uma conduta penal, até porque o fato não pode ser refeito, mas apenas narrado, desde um lugar, pelas pessoas (informantes, testemunhas, acusados etc.) ou pelas tecnologias (GPS, filmagem, interceptações etc.), tendo como pressuposto que o magistrado é um ignorante no tocante à imputação.

Assim é que a narrativa (Calvo González) ganha um estatuto especial, podendo-se arriscar na argumentação para compreender o parcial funcionamento deste modo de raciocínio, das verdades processuais e da bricolagem que a decisão representa, desde seus limites normativos.

Lugares e funções no Processo Penal No processo penal, se há uma hipótese/imputação falsificável (Popper), pode ser objeto de instrução processual, entendida como o mecanismo democrático para confirmação/refutação, em contraditório, diante da informação produzida. Não se trata da opinião exclusiva dos agentes processuais no sentido de ser verdade ou falsa a imputação, mas de o Estado acusador produzir informação suficiente capaz de justificar a destruição do castelo da presunção de inocência, já que todo acusado deveria largar inocente por definição constitucional.

Mas quando o julgador não assume um lugar passivo, ou seja, quando se coloca como o “curioso”, compulsivamente buscando informações, “como se” parte fosse, em busca de uma verdade real qualquer, não há processo penal e sim uma fraude em nome do bem. A postura de não ser substituto da acusação é o desafio de todos os dias, especialmente na lógica autoritária do Brasil, em que alguns se acham xerifes da verdade real.

Novo mapa da decisão contextual Se o processo penal constrói realidades passadas na e pela linguagem, a informação invocada, trazida e os sentidos possíveis, argumentados pelos agentes processuais, ganham relevo. As informações poderão, diante da estratégia da parte (condenação versus absolvição, para simplificar), ser favoráveis ou desfavoráveis. Mais ainda: não basta produzir informação, dado que o julgador precisa ter capacidade de compreensão. Exemplificando: não adianta articular uma defesa em face do agravamento do risco, nos crimes de trânsito (Lei 9.503/1997) se o julgador pensa (mapa mental) a partir do finalismo. A capacidade de percepção do julgador é condicionada por suas lentes teóricas, daí a importância não só da informação probatória. É necessário conhecer o mapa mental dos agentes processuais para o discurso possa se estabelecer.

A disputa processual pode ser compreendida, em alguns casos, como a busca de ordem narrativa pela acusação e a entropia narrativa da defesa, dado o princípio do in dubio pro reo, ainda que possa, para alguns, ser In Dubio Pro Hell (Alexandre Morais da Rosa e Salah Khaled Jr.). Logo, a luta pela (des)ordem cognitiva e narrativa é o mote do processo penal, território onde os agentes processuais interagem. Daí a importância dos trunfos, das táticas na cooptação do sentido do julgador, uma vez que a informação trivial, desprovida de originalidade, mostra-se incapaz de promover ajustes de sentido.

O julgador, por sua vez, diante das informações trazidas poderá enunciar um sentido, não o único, nem o definitivo, mas sim o possível diante da (des)ordem do discurso apontada, ciente das armadilhas e manipulações que a linguagem, lugar do logro, nos diria Lacan, proporciona.

Por mais que ainda existam perambulando nas casas da Justiça gente que acredite em verdade real, na luta projetiva contra o mal, em verdadeiras cruzadas, compreender a dimensão narrativa do processo e a construção das verdades contextuais pode ser um ganho teórico, sem que caíamos no realismo, nem na retórica. O preço é que não se decide com tanta certeza, nem tão feliz. Mas pensar assim depende da capacidade dos agentes de perceber a informação, ausente em quem permanece, para sempre, aferrado às suas crenças.

Nos limites de um artigo é o que se pode enunciar, esperando que algum mal estar possa se instalar, porque ele é condição de possibilidade para, quem sabe, poder repensar o que sempre se fez com tanta arrogância cognitiva.

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