Callegari e Linhares: Atos cotidianos como prova da lavagem
O artigo aborda a crítica à autonomia crescente do crime de lavagem de dinheiro em relação à infração penal antecedente, enfatizando que, muitas vezes, a acusação se baseia em atos cotidianos, como transações imobiliárias e doações entre familiares, sem provas concretas da proveniência ilícita dos ativos. Os autores alertam para o perigo de condenações fundamentadas apenas em indícios, reforçando a necessidade de comprovação robusta da infração anterior como elemento essencial no processo. A discussão evidencia a importância de um rigor probatório adequado para evitar acusações infundadas nesse contexto.
Artigo no Conjur
Temos realizado críticas à crescente autonomia do delito de lavagem de dinheiro [1], cada vez mais descolado da infração penal antecedente, movimento que, por um lado, conduziu o Legislativo brasileiro a introduzir na Lei de Lavagem um dispositivo expresso dispensando a existência de prova segura da infração antecedente para o processamento pelo crime de lavagem (artigo 2º, § 1º, da Lei 9.613/98), e, por outro lado, baliza o entendimento das cortes brasileiras no sentido de que basta a existência de indícios suficientes da infração prévia para a condenação pela lavagem [2].
Desse modo, em um processo com acusação de prática do crime de lavagem de dinheiro, mesmo que a proveniência ilícita do patrimônio lavado seja um elemento expresso do tipo penal, muito pouco se costuma perquirir sobre a prova da infração antecedente (que dá origem aos ativos), direcionando-se a atividade probatória especificamente aos atos de lavagem (ocultação ou dissimulação).
Entretanto, a atuação prática em processos dessa natureza tem nos demonstrado que a desatenção com a infração penal antecedente pode conduzir a acusações por lavagem de dinheiro fundadas em meros atos cotidianos. Um exemplo comum dessa prática é a acusação de cometimento de lavagem de dinheiro fundada em transações imobiliárias com valores declarados que destoam dos valores venais dos imóveis — p. ex., a declaração de compra de imóvel por metade do valor da avaliação realizada pelo poder público. Em alguns casos, essa simplória operação, inserida no contexto de uma denúncia por lavagem de dinheiro, conduz a presunções incriminatórias automáticas, como a de que parte dos valores da transação imobiliária (a diferença entre o valor declarado e o valor de avaliação pelo poder público) tenha sido ocultada e adimplida com dinheiro em espécie de origem delitiva — ignorando-se a difundida realidade de inconsistências em avaliações imobiliárias realizadas por municípios (pela defasagem de tais avaliações, pela utilização de critérios equivocados etc.).
Outro exemplo dessa banalização do crime de lavagem de dinheiro ocorre quando se utiliza, na tentativa de comprovação da lavagem, de operações patrimoniais realizadas entre familiares, especialmente de doações (p.ex., o cônjuge que doa imóvel a outro cônjuge; pai/mãe que doa veículo a filho/filha), sem qualquer outro indicativo de ato de lavagem para além da própria operação. Nessa situação, mesmo aquele que de boa-fé recebe o bem doado pode ser submetido ao processo, comumente considerado “laranja” do agente doador.
Ao se reduzir demasiadamente o standard probatório exigido em relação à infração penal antecedente, admitindo-se como suficientes meros indícios de ocorrência dessa infração prévia (ou seja, a possibilidade de que tal infração não tenha ocorrido será sempre significativa), torna-se possível que atos cotidianos como os mencionados acima fundamentem acusações de prática de lavagem de dinheiro.
Mesmo que, para além do ato objetivo de lavagem, um juízo condenatório ainda dependa da comprovação do dolo de lavagem, consideramos extremamente temerário deixar a definição de tais situações à sempre obscura avaliação do elemento subjetivo do crime. Em nosso entendimento, situações como essas devem ser combatidas por meio de uma alteração de posicionamento em relação à infração penal antecedente geradora dos ativos: ela é o elemento originário do crime de lavagem, filtro típico contra acusações infundadas, devendo-se dela exigir comprovação como se exige em relação à própria conduta de ocultação ou dissimulação.
[1] Nesse sentido: https://www.conjur.com.br/2022-dez-13/callegari-linhares-lavagem-dinheiro-conexao-delito-previo
[2] Com mais profundidade, em nosso livro: CALLEGARI, André Luís; LINHARES, Raul Marques. Lavagem de Dinheiro: com a jurisprudência do STF e do STJ. Rio de Janeiro: Marcial Pons, 2022.
Referências
Comunidade Criminal Player
Elabore sua melhor defesa com apoio dos maiores nomes do Direito Criminal!
Junte-se aos mais de 1.000 membros da maior comunidade digital de advocacia criminal no Brasil. Experimente o ecossistema que já transforma a prática de advogados em todo o país, com mais de 5.000 conteúdos estratégicos e ferramentas avançadas de IA.
Converse com IAs treinadas nos acervos de Aury Lopes Jr, Alexandre Morais da Rosa, Rodrigo Faucz, Gabriel Bulhões, Cristiano Maronna e outros gigantes da área. Explore jurisprudência do STJ com busca inteligente, análise de ANPP, depoimentos e muito mais. Tudo com base em fontes reais e verificadas.

Ferramentas de IA para estratégias defensivas avançadas
- IAs dos Experts: Consulte as estratégias de Aury Lopes Jr, Alexandre Morais da Rosa, Rodrigo Faucz, Gabriel Bulhões e outros grandes nomes por meio de IAs treinadas em seus acervos
- IAs de Jurisprudência: Busque precedentes com IAs semânticas em uma base exclusiva com mais de 200 mil acórdãos do STJ, filtrados por ministro relator ou tema
- Ferramentas para criminalistas: Use IA para aplicar IRAC em decisões, interpretar depoimentos com CBCA e avaliar ANPP com precisão e rapidez

Por que essas ferramentas da Criminal Player são diferentes?
- GPT-4 com curadoria jurídica: Utilizamos IA de última geração, ajustada para respostas precisas, estratégicas e alinhadas à prática penal
- Fontes verificadas e linkadas: Sempre que um precedente é citado, mostramos o link direto para a decisão original no site do tribunal. Transparência total, sem risco de alucinações
- Base de conhecimento fechada: A IA responde apenas com conteúdos selecionados da Criminal Player, garantindo fidelidade à metodologia dos nossos especialistas
- Respostas com visão estratégica: As interações são treinadas para seguir o raciocínio dos experts e adaptar-se à realidade do caso
- Fácil de usar, rápido de aplicar: Acesso prático, linguagem clara e sem necessidade de dominar técnicas complexas de IA

Mais de 5.000 conteúdos para transformar sua atuação!
- Curso Teoria dos Jogos e Processo Penal Estratégico: Com Alexandre Morais da Rosa e essencial para quem busca estratégia aplicada no processo penal
- Curso Defesa em Alta Performance: Conteúdo do projeto Defesa Solidária, agora exclusivo na Criminal Player
- Aulas ao vivo e gravadas toda semana: Com os maiores nomes do Direito Criminal e Processo Penal
- Acervo com 130+ Experts: Aulas, artigos, vídeos, indicações de livros e materiais para todas as fases da defesa
- IA de Conteúdos: Acesso a todo o acervo e sugestão de conteúdos relevantes para a sua necessidade

A força da maior comunidade digital para criminalistas
- Ambiente de apoio real: Conecte-se com colegas em fóruns e grupos no WhatsApp para discutir casos, compartilhar estratégias e trocar experiências em tempo real
- Eventos presenciais exclusivos: Participe de imersões, congressos e experiências ao lado de Aury Lopes Jr, Alexandre Morais da Rosa e outros grandes nomes do Direito
- Benefícios para membros: Assinantes têm acesso antecipado, descontos e vantagens exclusivas nos eventos da comunidade
Assine e tenha acesso completo!
- 75+ ferramentas de IA para estratégias jurídicas com base em experts e jurisprudência real
- Busca inteligente em precedentes e legislações, com links diretos para as fontes oficiais
- Curso de Alexandre Morais da Rosa sobre Teoria dos Jogos e Processo Penal Estratégico
- Curso Defesa em Alta Performance com Jader Marques, Kakay, Min. Rogério Schietti, Faucz e outros
- 5.000+ conteúdos exclusivos com aulas ao vivo, aulas gravadas, grupos de estudo e muito mais
- Fóruns e grupos no WhatsApp para discutir casos e trocar experiências com outros criminalistas
- Condições especiais em eventos presenciais, imersões e congressos com grandes nomes do Direito
Para mais detalhes sobre os planos, fale com nosso atendimento.
Quero testar antes
Faça seu cadastro como visitante e teste GRÁTIS por 7 dias
- Ferramentas de IA com experts e jurisprudência do STJ
- Aulas ao vivo com grandes nomes do Direito Criminal
- Acesso aos conteúdos abertos da comunidade
Já sou visitante
Se você já é visitante e quer experimentar GRÁTIS por 7 dias as ferramentas, solicite seu acesso.