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Meus pêsames ao MP-PR: o Ministério Público que morreu

O artigo aborda a crise de identidade do Ministério Público do Paraná (MP-PR), evidenciada pela instauração de um procedimento de remoção contra o promotor Jacson Luiz Zílio, que atua com cautela em casos de tráfico de drogas. O texto critica a postura do MP-PR, que, em busca de condenações a qualquer custo, ignora o respeito às evidências e à independência funcional, promovendo uma cultura de punição que atenta contra os princípios de justiça e democracia. A autora, Bartira Macedo de Miranda, questiona a real missão do MP e ressalta como essa abordagem afeta a legitimidade da instituição.

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O que é o Ministério Público? Quem são seus membros? Serão eles os herdeiros mais modernos dos infames Heinrich Kramer e James Sprenger? A que(m) o Ministério Público está subordinado?

A corregedora-geral do Ministério Público do Paraná nos provoca essas indagações ao ter instaurado procedimento de remoção compulsória por motivos de interesse público contra o promotor de justiça Jacson Luiz Zílio. Acreditem, é verdade esse absurdo. Depois de instaurar sindicância que resultou em arquivamento, inconformada porque “reconheceu-se a plausibilidade da tese defensiva”, restando afastada a “configuração da infração disciplinar imputada”, a Corregedora lamenta “[…] o consequente arquivamento da sindicância”.

Acho curiosa essa lamentação de grande parte do Ministério Público brasileiro quando um processo não resulta em condenação. Para eles, processo sem condenação é inefetividade e impunidade. Pouco importam as provas produzidas. Se o processo não satisfaz os seus desejos punitivos, levantam-se em ira e agem como crianças quando a brincadeira termina em briga: “você vai ver!”. Para eles, o ordenamento jurídico é apenas um material legislativo manipulável para, muitas vezes com razões cínicas, produzir condenações automáticas, mesmo que injustas, custe o que custar.

Os custos do processo penal são altos. Não são apenas custos financeiros (qual é o orçamento do Ministério Público?), mas também sociais (quantas famílias e filhos atingidos por condenações injustas?). Bem, não vamos falar dos custos pessoais para os réus porque, em um país que não se comove com casos como o do reitor Cancelier, falar de direitos dos réus é quase uma declaração de coautoria.

Pois bem. Apesar de reconhecer a inexistência da infração imputada, a corregedora, por outro lado, talvez usando o seu tirocínio ministerial, encontrou “subsídios e dados” de que o promotor de justiça “reiteradamente se opõe ao entendimento de outros agentes ministeriais, atuando com pouquíssima combatividade em feitos relacionados a crimes de tráfico de drogas”, o que, segundo ela, “afronta o princípio da unidade do Ministério Público e contraria o interesse público”.

Sim, é verdade esse absurdo. A corregedora se põe a mostrar “a desvalorização da unidade ministerial” supostamente evidenciada na atuação do promotor, que teria “desprezo pelo posicionamento firmado por diversos outros membros do Ministério Público do Estado do Paraná”. A corregedoria se deu ao trabalho de fazer uma “pesquisa”, com levantamento de dados, amostragem, delimitação temporal e metodologia, tudo para demonstrar que encontrou feitos com manifestação ministerial subscrita pelo Promotor — pugnando pela rejeição das denúncias — e, ainda, pedidos recorrentes de improcedência da denúncia. Ademais, para escândalo da corregedora, localizou-se um recurso de apelação contra uma sentença condenatória!

Conforme o relato da corregedora, todos esses casos dizem respeito a inquéritos policiais destinados à apuração de crimes de tráfico de drogas — em que se apurou a ilicitude da busca pessoal e/ou domiciliar — e processos com insuficiência de provas. Tratam-se, pois, de casos de atuação ilegal da polícia em situações que demonstram o racismo estrutural e institucional, sendo que, em casos análogos, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) vem reiteradamente reconhecendo as ilegalidades e decretando as nulidades processuais. No entanto, a corregedora diz que “o Ministério Público não pode se curvar, indistintamente, aos entendimentos firmados pelo Superior Tribunal de Justiça — que nem sequer são precedentes vinculantes —, cabendo ao órgão de acusação manifestar insurgência”. Não há a indicação de ilegalidade na atuação do promotor de justiça. Vê-se que se pretende a punição pelo entendimento jurídico manisfestado no exercício da função, é uma punição que se dirige ao pensamento jurídico, cientificamente fundado, com clara violação da independência funcional.

A corregedora está inconformada com um promotor de justiça que cumpre o seu dever funcional, a quem incumbe a defesa da ordem jurídica. Se bem lida a representação da corregedora, chegamos à conclusão, pela sua própria narrativa, que se está perseguindo um promotor que exerce as suas funções com zelo e probidade, acusando-o de “exercer as suas funções com zelo e probidade”.

Para que não reste dúvida do que aqui se está relatando, cito mais uma vez a manifestação da “corregedora:

“É necessário esclarecer que o instituto da remoção compulsória não possui caráter disciplinar, na medida em que não está necessariamente relacionado à prática de faltas funcionais, por lesão a deveres funcionais previstos na legislação institucional de regência, ainda que com tais infrações disciplinares possa, efetivamente, se relacionar. Essencialmente, o instituto está relacionado à intangibilidade do interesse público na continuidade e regularidade da prestação dos serviços pelo Ministério Público à população, através de seus órgãos de execução.”

Segundo a corregedora do MP-PR, a atuação do promotor de Justiça Jacson Zílio “apresenta reduzida combatividade e destoa do entendimento institucional, ferindo a identidade ministerial”. É verdade esse absurdo. Uma instituição tão essencial à jurisdição e à democracia não deveria considerar a independência funcional como um risco às permanências autoritárias no campo do direito penal. Antes, deveria procurar entender como ela própria está organizada para funcionalizar um tipo de direito penal (inquisitorial, discriminatório e racista) que não tem legitimidade em uma sociedade democrática.

Tristes dos membros do Ministério Público que não se veem como promotores da Justiça, mas apenas como promotores da acusação. Um Ministério Público que se insurge contra as decisões (não racistas) do Superior Tribunal de Justiça para se submeter ao (racismo do) policial da esquina, e se perde na teia das invejas e vaidades internas, é um órgão que faleceu para o projeto constitucional de estado democrático de direito.

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