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Inadmissibilidade de recurso especial em Habeas Corpus

O artigo aborda a inadmissibilidade da interposição de recurso especial pelo Ministério Público em casos de Habeas Corpus, enfatizando que a Constituição não prevê esse remédio processual. A análise ressalta que o Habeas Corpus possui natureza autônoma e deve garantir a liberdade individual, sendo exclusividade da defesa, enquanto o MP não pode recorrer da concessão da ordem, mantendo o foco na proteção dos direitos fundamentais. A conclusão reitera a necessidade de preservar a função libertária do Habeas Corpus, evitando que a atividade acusatória interfira nesse processo.

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A interposição de recurso especial pelo Ministério Público em sede de Habeas Corpus esbarra no próprio texto constitucional, que não prevê o manejo de tal instrumento em sede mandamental.

Não há palavras soltas na CF, tampouco se podem expandir os estreitos limites por ela impostos, especialmente em sede criminal, porquanto a ponderação de princípios força a interpretação mais favorável ao cidadão.

Dada à especialidade com que o artigo 105, II, CF trata a matéria recursal atinente aos Habeas Corpus, a única via recursal é o recurso ordinário, e, mesmo assim, apenas nas hipóteses em que denegada a ordem.

Não se trata a restrição de mera liberalidade do legislador constituinte originário, mas de uma interpretação teleológia e sistemática do direito brasileiro, na medida em que disponibiliza o HC como ação mandamental autônoma dirigida à cassação de violação à garantia fundamental à liberdade — ou seja: violação das mais graves em nosso ordenamento —, cuja concessão pode se dar de ofício em razão da premência do dano causado à pessoa humana, sendo, por conseguinte, remédio constitucional eletivo unicamente à defesa, jamais à acusação, a qual sequer figura como parte na relação processual.

Inviável, diante de acórdão concessivo de ordem de Habeas Corpus — o que reconhece a violação a direito fundamental —, seja ela reformada por intermédio de recurso da acusação, ainda que travestido de custus legis em situações em que tais.

A ausência de previsão na CF de recurso manejável pelo MP contra decisão de concessão de ordem de Habeas Corpus (falta de reserva constitucional) é política traçada pelo constituinte originário e não pode ser suplantada, sub-repticiamente, pelo recurso especial, cujo objeto, embora mais genérico, não se destina a avaliar eventuais violações a direitos fundamentais.

A falta de expressa previsão legal — constitucional, na hipótese — retira do recurso um dos seus indispensáveis pressupostos objetivos.1 Ou, como preferem outros doutrinadores, a exigência de previsão legal do recurso constitui condição de admissibilidade, implicando sua inexistência na impossibilidade jurídica do pedido, vale dizer: no seu não cabimento.2

Seja pressuposto objetivo ou condição de admissibilidade, a melhor doutrina diverge na classificação, mas é unânime em ensinar que a falta de previsão legal (leia-se constitucional) inviabiliza o recurso.

Nem se diga que a previsão genérica do especial apelo se sobrepõe à restrição recursal feita em Habeas Corpus, porque, nessa ação mandamental sui generis, quis o constituinte manter a histórica natureza jurídica de garantia suprema do status libertatis, o que cairia por terra se houvesse reserva constitucional para recurso contra a concessão de writ. Daí está, portanto, a decorrer a vedação do desvio de finalidade jurídico-constitucional do HC.

Ademais, sabe-se que uma importante característica dos recursos é “não ensejarem a instauração de nova relação processual”.3 Pacificada está a ideia de que o Habeas Corpus (dentre outros, como a revisão criminal) constitui outra ação, exatamente por configurar relação processual diversa, com autor diferente e pedido outro.

Ora, um recurso contra decisão concessiva do mandamus não permite a ingerência de um estranho (o Ministério Público, com roupagem de fiscal da lei) à relação processual (que se estabelece entre o impetrante/autor e o coator), a pleitear contrariamente ao jus libertatis protegido pelo remédio heroico, a buscar desconstituir a decisão garantidora do direito de ir e vir prolatada no instrumento próprio e exclusivo — e isso no mesmo processo e na mesma ação.

A irrecorribilidade da concessão do remédio heroico insere-se perfeitamente e com total lógica no sistema constitucional. A CF emprestou, ao estabelecer as normas de direitos e garantias fundamentais — dentre eles, o Habeas Corpus — ampliação do domínio da liberdade individual, com a consequente restrição da atividade estatal.

Ilógico e assistêmico seria permitir, em sede desse especial instituto, peleja da parte acusatória ou do fiscal da lei com o objetivo de cassar logo a precípua razão de existência do writ.

O Superior Tribunal de Justiça assim decidiu:

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. ORDEM CONCEDIDA NA ORIGEM. NÃO CABIMENTO. Conforme comando constitucional previsto no art. 105, II, alínea a, não cabe recurso ordinário quando a decisão for concessiva de writ. (Precedentes). Entendimento que se aplica ao habeas corpus substitutivo de recurso ordinário. Writ não conhecido.4

Conclui-se que, fora o recurso especial (e o extraordinário) encontrar-se enclausurado por cláusula pétrea, porque a complementar a ampla defesa e o devido processo penal, se em sede de habeas corpus em que o MP se arvora a impetra-lo, o STJ, além de não permitir o desvio da finalidade libertária, veda apelo especial em writ impetrado pela defesa técnica do cidadão e concedido em acórdão do qual não cabe extremo por falta de reserva constitucional.

Necessário manter-se, à disposição da pessoa humana que tenha, ou esteja na eminência de ter, violação à sua liberdade de ir e vir, sem tentar emprestar interpretação hermenêutica típica dos “saltos triplo carpado”, o Habeas Corpus no lugar em que sempre esteve, tirando nos “anos de chumbo”, no direito brasileiro; confia-se.

1 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal – 4º vol. 19ª ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 302. 2 GRINOVER, Ada da Pellegrini et ali. Recursos no processo penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1996, pp. 76-77. 3 GRINOVER, Ada da Pellegrini et ali. Recursos no processo penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1996, p. 30. 4 STJ. HC nº 36716. Relator o ministro Felix Fischer. Publicado no DJ em 8/11/2004.

Referências

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