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O Direito Penal está preparado para enfrentar a nova criminalidade?

O artigo aborda a inadequação da dogmática penal atual frente à nova criminalidade, refletindo sobre como a teoria tradicional não se adapta às complexidades das organizações criminosas. Discute-se a necessidade de novas abordagens para a imputação de responsabilidade, considerando o caráter estruturado e coletivo dos crimes, especialmente em contextos de delitos empresariais. O texto também levanta a preocupação com a potencial renúncia a garantias jurídicas em busca de eficiência no combate à criminalidade contemporânea.

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Com o avanço da criminalidade e a proteção de novos bens jurídicos, o questionamento que se coloca é se a dogmática atual está preparada para enfrentar esse desafio.

A estrutura da teoria geral do delito sempre foi pensada para a criminalidade tradicional, focada na proteção de bens jurídicos individuais e com regras claras de imputação. Com a tipificação de novas condutas, como as organizações criminosas, o legislador precisou mudar o paradigma de incriminação diante da nova demanda de combate a essa nova criminalidade. Quando se trata de uma estrutura para delinquir, existe já uma periculosidade ex ante, ou seja, não se pune a prática do crime, mas a mera associação, um juízo de punibilidade que se aproxima àquela dos atos preparatórios.

Diferentemente dos casos de coautoria ou participação, em que a associação não é estável e está vinculada normalmente para a prática de apenas um delito, nos delitos de organização criminosa existe uma vocação de autoconservação entre os seus membros, ou seja, ainda que exista relativa independência entre eles há a institucionalização da organização para a prática delitiva e a sinergia entre seus membros.

Uma das características das organizações criminais é a planificação e divisão de trabalho, fato este que acaba por resultar em maior efetividade na comissão do delito. Quando há um processo coletivo na realização das atividades criminosas isso acaba se traduzindo em especialização e profissionalismo de seus membros. Essa talvez seja uma das maiores dificuldades da dogmática tradicional no enfrentamento de organizações criminosas, que cada vez mais se servem de assessores técnicos e profissionais das mais diversas áreas para cometer os delitos. Veja-se os exemplos de lavagem de dinheiro, em que as organizações se utilizam de técnicas avançadas para ocultar ou dissimular a origem delitiva dos valores obtidos de forma ilícita.

De outro lado, há a constatação de que os fatores de inibição diminuem quando se atua em grupos estruturados – pela própria dinâmica de grupo e a psicologia social envolvida. É dizer: em muitos casos, individualmente, o sujeito não cometeria determinado tipo de delito associado às organizações criminosas. Isso se traduz na potencialização dos comportamentos e uma diluição material das condutas, ou seja, há divisão de responsabilidades na medida em que o indivíduo não se sente individualmente responsável pelo resultado. Isso implica na dificuldade de comprovar a individual e materialmente a responsabilidade criminal de cada participante, fugindo à regra tradicionais da prova sobre autoria e participação delitiva.

Dilema

O panorama exposto é apenas um dos inúmeros exemplos de como a dogmática não avançou sobre a criminalidade associada a pluralidade de agentes e reflete a necessidade de que o Direito Penal se debruce sobre esses novos desafios. E isso não se traduz só nas organizações criminais voltadas aos delitos tradicionais, mas também acaba ocorrendo nos delitos empresariais, em relação aos quais há uma certa dificuldade de compreensão de como atribuir a responsabilidade no seio de grandes corporações.

Desde que Roxin criou a teoria do domínio do fato através de aparelhos de poder, reconhecida e utilizada inúmeras vezes para os delitos empresariais, ainda se discute se este é o melhor modelo de imputação e atribuição de responsabilidade para sócios e/ou diretores de empresas.

Nesse avanço de proteção de novos bens jurídicos, a dogmática reagiu de alguma forma, antecipando as barreiras de proteção do Direito Penal – como a criminalização do estágio prévio, ou seja, punição dos atos preparatórios, que antes eram exceção; criação de cada vez mais tipos penais de perigo abstrato, normas penais em branco e tipos penais abertos; flexibilidade nas regras de imputação e de autoria e participação, apenas para citarmos alguns exemplos. A indagação é se essas medidas foram suficientes para frear essa nova criminalidade ou se de fato apenas possibilitou um processo penal com menos garantias ao acusado, em nome de uma reclamada eficiência no combate aos delitos da modernidade.

O dilema que se impõe no momento é se vale a renúncia às garantias tão arduamente conquistadas em troca de uma suposta e ainda não verificada, diante da ausência de dados empíricos sobre a utilização de instrumentos que antecipam as instâncias punitivas no combate a essa nova criminalidade. Ainda que se diga que tais ferramentas somente são utilizadas para determinados delitos, recorde-se que o passado recente demonstra que a criação de instrumentos de emergência, desenhados para circunstâncias de exceção, acaba se tornando a regra, incorporados às legislações comuns. Ou seja, um caminho sem retorno.

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