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Conheça os embargos de declaração na adi n. 3943 e alguns esclarecimentos necessários sobre stf, acp e defensoria pública

O artigo aborda a análise dos embargos de declaração na ADI n. 3943, onde o STF ampliou o conceito de “necessitado” no contexto do processo coletivo. Os autores discutem a legitimidade da Defensoria Pública e do Ministério Público, destacando a importância de respeitar as diferenças entre as fases coletiva e individual da justiça, evitando a conflituosa interpretação da hipossuficiência econômica. A reflexão gira em torno da essencialidade da Defensoria Pública para garantir o acesso à justiça coletiva, considerando as particularidades dos grupos hipervulneráveis.

Artigo no Empório do Direito

Por Helom Nunes e Maurilio Casas Maia – 26/08/2015

Na ADI n. 3943, o STF adotou o conceito amplo de necessitado para o processo coletivo. Tal posicionamento evitou a leitura da legitimidade defensorial na 2ª onda de acesso à Justiça (Processo Coletivo) por um viés pré-88 e meramente individual, ou seja, o STF não cometeu o equívoco de ler o “novo” com o olhar “velho”, apresentando visão efetivamente constitucionalizada.

Não obstante a postura garantidora e maximizadora do acesso à Justiça Coletiva adotada pelo Supremo Tribunal Federal e apesar da coerência e completude do voto de Ministra Cármen Lúcia, a CONAMP opôs Embargos de Declaração em 14/8/2015, alegando contradição no referido julgado.

Nos termos de 8 (oito) páginas bem redigidas, a parte Embargante se esforçou para apresentar supostas incongruências entre os votos da ADI n. 3943. Segundo a redação, eis a dúvida que decorreria do julgado: A legitimidade coletiva da Defensoria Pública independeria ou não da caracterização da hipossuficiência econômica?

E os Embargos de Declaração vão além, revelando certa incompreensão com o fato de o STF ter adotado o conceito mais limitado de “necessitado” para as supervenientes fases de liquidação e execução individuais – a resposta está exatamente nisso: individual e não coletivo. Uma reflexão se impõe…

As ações coletivas propostas pelo Estado Defensor e o Ministério Público, por exemplo, representam potencial mercado para advocacia privada. Isso porque, geralmente, a ação coletiva, tão logo finalizada a fase de cognição, pode admitir as chamadas liquidações e execuções individuais, para as quais o Ministério Público e a Defensoria Pública – enquanto legitimados extraordinários –, não possuem legitimidade individual, pois em tais fases a legitimação é predominantemente ordinária.

Podem ser dezenas, centenas ou milhares de beneficiados pela sentença coletiva. Porém, cada um beneficiado guardará suas peculiaridades socioeconômicas – uns poderão contratar (constituir) advogados e outros talvez dependam da atuação (assistência) defensorial, conforme a situação econômica de cada um deles. Nesse ponto, todavia, a iniciativa é individual (legitimação ordinária), fora do alcance da legitimidade extraordinária da Defensoria Pública e do Ministério Público, salvo posterior fluid recovery.

No contexto exposto, pode-se dizer que o STF agiu bem. Ora, se a legislação admitisse que o Ministério Público (como legitimado extraordinário) e a Defensoria Pública (seja como legitimado extraordinário ou como assistente jurídico-processual, postulante) ingressassem com ações individuais em quaisquer situações, independentemente da situação econômica, certamente a advocacia privada se veria em apuros, perdendo indevidamente espaço. Além disso, a Defensoria Pública contrariaria sua própria missão no aspecto individual.

No entanto, a solução encontrada pelo STF garantiu a amplitude necessária ao acesso à Justiça Coletiva – sem deixar de reconhecer as peculiaridades da fase coletiva e individual decorrentes do Processo metaindividual –, e fez isso respeitando o espaço reservado à advocacia privada, conforme o ditame constitucional.

Em verdade, para que se compreenda a conclusão do STF é preciso perpassar pela riqueza do voto de Ministra Cármen Lúcia que, juntamente com sua assessoria, realizou um sério estudo sobre a superação do individualismo no processo coletivo para, a partir daí, deflagrar uma análise do conceito específico de “necessitado” para o processo coletivo, conforme o avanço da doutrina brasileira. Para acessar ao voto clique aqui.

Em suma, partindo-se do pressuposto de que o STF adotou um conceito amplo de necessitado para o processo coletivo e que distinguiu a fase coletiva (da legitimação extraordinária) da fase de liquidação ou execução individual (da legitimação ordinária), tem-se o seguinte quadro explicativo:

Com se vê, o leitor deve ficar atento ao ideal constitucional evidenciado pelo STF, de forma a não cometer o equívoco de aplicar o conceito de “necessitado” do “processo individual” no âmbito “coletivo” e vice-versa, pois aí sim, poderia correr o risco de frustrar a promessa constitucional de acesso à justiça – especialmente a segunda onda, tutela coletiva – pela Defensoria Pública, Instituição que a cada dia evidencia sua essencialidade à justiça e muito bem vem contribuindo com a proteção coletiva no Estado Brasileiro, conforme múltiplos resultados socialmente relevantes apresentados I (veja aqui) e II (veja aqui) Relatórios Nacionais de Atuação Coletiva da Defensoria Pública. Com isso, resta patente: Não se pode frear a defensoria sem frustrar uma promessa constitucional e atentar contra a cidadania.

Há ainda uma questão levantada pelos Embargos de Declaração: Como ficaria a proposta de controle concreto da legitimidade defensorial citada pelo ministro Barroso? Isso significaria uma submissão do conceito de necessitado coletivo ao critério econômico?

Em primeiro lugar, a menção do ministro Barroso é um obiter dictum – se você não conhece o conceito, vide texto em parceria com o professor Alexandre Morais da Rosa aqui. E isso é certo: falar dos clientes Itaú Personnalité ou membros do Iate Clube é hipótese imaginada pelo ministro Barroso para tentar ilustrar que grupos sem qualquer vulnerabilidade social – uma vez que, ao menos em princípio, em tais exemplos não haveria que se falar, prima facie, de grupos desorganizados, sem conhecimento jurídico ou necessitados econômicos – não mereceriam a tutela coletiva do Estado (aí sendo possível incluir Ministério Público e Defensoria Pública). Aliás, o ministro Barroso, ao lançar a questão do controle da legitimidade, apresentou-a após mencionar que existiriam limites à legitimidade coletiva ministerial. E tudo o quanto foi mencionado no presente parágrafo (Iate Club, Itaú personnalité e legitimidade ministerial) não era e não foi objeto de cognição. Certamente, se fossem essas as hipóteses debatidas muito ainda seria afirmado, debatido e esclarecido, a exemplo da existência ou não da condição de vulnerabilidade dos consumidores do Itaú Personnalité (CDC, art. 4º, I) e do dever do Estado (em sentido amplo) tutelar coletivamente tais consumidores, nos termos constitucionais (art. 5º, XXXII e art. 170, V). Entretanto, nada disso foi debatido ou será – a não ser que os ministros do STF tenham a ambição de imaginar todas as hipóteses fáticas nas quais poderiam incidir o debate já travado – missão essa humanamente impossível.

Com efeito, uma observação se impõe: mesmo no processo individual, algumas situações excepcionais de vulnerabilidade e necessidade podem se apresentar independentemente do viés meramente econômico do necessitado – é o caso da indisponibilidade da defesa penal – defesa essa que o Brasil se comprometeu a cobrir por tratados internacionais –, e da curadoria especial para réu revel citado por edital – a qual é bem tratada pela legislação processual civil. Tais questões confirmam que ser “necessitado” e estar em quadro de “insuficiência de recursos” não é conceito jurídico indeterminado por qualquer outra razão, senão pela riqueza e pluralidade fática dos fatos humanos e consequentemente jurídicos. Daí, a prosperidade da ciência jurídica e sua frequente superação em um Estado constitucional e democrático de Direito.

Em síntese, o STF não firmou antecipadamente o conceito de necessitado, principalmente para o processo coletivo. E não poderia fazê-lo. Se o fizesse, decapitaria conceitos jurídicos indeterminados – necessitados e insuficiência de recursos –, com larga abertura semântica, conceitos esses propositadamente eleitos pela Assembleia Constituinte para que o intérprete pudesse reconhecer os quadros de vulnerabilidade e necessidade de acordo com as circunstâncias apresentadas no contexto democrático das crises jurídicas.

As conclusões aqui lançadas repercutem diretamente sobre o julgamento dos EREsp n. 1192577 – vide mais detalhes aqui –, pela qual a Corte Especial do STJ definirá se coletividade de consumidores hipervulneráveis – idosos e eventualmente enfermos –, pode ser considerada necessitada coletiva para fins de tutela do Estado Defensor. Por certo, com a adoção do conceito amplo de necessitado no Processo Coletivo não deveria existir qualquer dúvida que a Defensoria Pública é instrumento de proteção do consumidor (art. 5º, XXXII e art. 170, V) e de acesso à Justiça Coletiva (art. 5º, XXXV) em prol de comunidade de hipervulneráveis necessitados de tutela jurídica (art. 5º, LXXIV c/c art. 134). É essa, ao que parece, a única conclusão admissível frente a uma ementa[1] que requesta e exige a máxima efetividade do acesso à Justiça coletiva para a consecução dos objetivos constitucionais da República brasileira.

Conheça aqui o inteiro teor dos Embargos de Declaração apresentados na ADI n. 3943.

Notas e Referências:

[1] “AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEGITIMIDADE ATIVA DA DEFENSORIA PÚBLICA PARA AJUIZAR AÇÃO CIVIL PÚBLICA (ART. 5º, INC. II, DA LEI N. 7.347/1985, ALTERADO PELO ART. 2º DA LEI N. 11.448/2007). TUTELA DE INTERESSES TRANSINDIVIDUAIS (COLETIVOS STRITO SENSU E DIFUSOS) E INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. DEFENSORIA PÚBLICA: INSTITUIÇÃO ESSENCIAL À FUNÇÃO JURISDICIONAL. ACESSO À JUSTIÇA. NECESSITADO: DEFINIÇÃO SEGUNDO PRINCÍPIOS HERMENÊUTICOS GARANTIDORES DA FORÇA NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO E DA MÁXIMA EFETIVIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS: ART. 5º, INCS. XXXV, LXXIV, LXXVIII, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. INEXISTÊNCIA DE NORMA DE EXCLUSIVIDAD DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA AJUIZAMENTO DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO INSTITUCIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO PELO RECONHECIMENTO DA LEGITIMIDADE DA DEFENSORIA PÚBLICA. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. (STF, ADI 3943, Relatora Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, j. 7/5/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-154 DIVULG 05-08-2015 PUBLIC 06-08-2015).

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Helom Nunes é Defensor Público do Estado do Amazonas. Especialista em Direito Público pela Universidade do Sul de Santa Catarina. Bacharel em Direito pela Universal Federal do Amazonas.

Maurilio Casas Maia é Mestre em Ciências Jurídicas pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Pós-Graduado lato sensu em Direito Público: Constitucional e Administrativo; Direitos Civil e Processual Civil. Professor de carreira da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e Defensor Público (DPE-AM).

Email: [email protected] Facebook: aqui

Imagem Ilustrativa do Post: Justitia (Themis) // Foto de: Ricardo / Com alterações

Disponível em: https://www.flickr.com/photos/ricardor/3489300195

Licença de uso: http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/legalcode

O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.

Referências

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