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Como o STF pode ampliar a vulnerabilidade do contribuinte no Tema nº 1.270?

O artigo aborda a discussão sobre o impacto do Tema nº 1.270 no Supremo Tribunal Federal, que centra na legitimidade do Ministério Público para realizar a liquidação coletiva de sentenças em ações civis públicas. O autor, Maurilio Casas Maia, destaca os riscos de aumentar a vulnerabilidade financeira dos contribuintes, resultante de decisões judiciais que podem gerar custos desnecessários. Ele também critica a falta de análise da relação custo-benefício nas penalidades e no custeio de processos, enfatizando a necessidade de uma abordagem mais eficiente e respeitosa ao contribuinte na atividade jurisdicional.

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O Tema nº 1.270, cujo julgamento foi suspenso por pedido de vistas do ministro Flávio Dino neste mês de maio no Supremo Tribunal Federal, pode se apresentar enquanto decisão respeitosa aos contribuintes ou, por outro lado, como mais uma causa de “vulnerabilidade financeira” dos pagadores de impostos. Isso porque algumas decisões judiciais têm o poder de impor gastos desnecessários e ineficazes aos contribuintes.

O ministro Flávio Dino, do STF

Esse é o caso, por exemplo, do Enunciado Sumular nº 438 do STJ, impondo o custeio de processos que já não terão nenhum resultado útil à sociedade — ao contrário, causando prejuízos e retardos no andamento de outros processos que poderiam ter melhor desfecho. Tal problema vem sendo denunciado de norte a sul do país, com ampla repercussão, sem que ocorra efetivo movimento dos tribunais superiores sobre a questão.

Aliás, mesmo no plano legislativo e individual penal a majoração de penas sem nenhuma análise da correlação entre período de prisão, custo prisional médio e efetividade da ressocialização, também denota imensa desconsideração pela racionalidade do contribuinte, fonte de custeio dos aparatos estatais. Dramaticamente, legisladores e julgadores, em seus afazeres, geralmente não sabem informar o custo médio da prisão estimado à sociedade e omitem-se em informar se a majoração penal realmente é mais efetiva para fins de ressocialização, ou seja, a questão da relação custo-benefício. Assim, não se sabe dizer quanto “custará” a sentença proferida, mesmo com dados para tanto. Como relembram Alexandre Morais da Rosa e Aury Lopes Júnior, a “conta (…) é arcada por toda a sociedade”.

Por outro lado, saindo da esfera penal, o problema da imposição do custeio ineficiente por decisões judiciais acarreta, no mínimo, uma dupla dimensão da vulnerabilidade do contribuinte, uma extraprocessual e outra intraprocessual, respectivamente: “vulnerabilidade financeira“ (compreendida aqui no efetivo custeio medidas ineficientes); e “vulnerabilidade precedental“, quando, diante da formação de precedentes vinculantes, o custeio ineficiente é imposto sem efetiva participação e consulta dos contribuintes, sequer levando em consideração o referido impacto de custeio.

Legitimidade do Ministério Público

Com efeito, a dupla vulnerabilidade do contribuinte deve(ria) vir à pauta no julgamento do Tema nº 1.270 do STF (vide RE nº 1.449.302) — cuja questão de debate é sobre a: “Legitimidade do Ministério Público para promover a liquidação coletiva de sentença proferida em ação civil pública sobre direitos individuais homogêneos disponíveis, visando a reparação de danos individualmente sofridos pelas vítimas ou seus sucessores.”

Isso porque admitir a legitimidade executiva coletiva ao Ministério Público (bem como para liquidação coletiva), quando cabível, é medida mais econômica à satisfação dos direitos dos membros da coletividade lesada e, igualmente, respeitosa ao bolso dos pagadores de impostos.

Nesse sentido, nos autos do RE nº 1.449.302 (do Tema nº 1270), Camilo Zufelato [1] aporta em razões de economicidade e qualificação da atuação jurisdicional com a admissão da liquidação/execução coletiva quando cabível. Aponta ele como fatores benéficos à admissibilidade: “(i) economia ao Poder Judiciário em variados aspectos (tempo, insumos, recursos financeiros etc.), ou seja, contribui sobremaneira para a eficiência na administração da justiça, bem assim (ii) garantia de efetividade de direitos que, ainda que patrimoniais (…)”.

De igual modo, Arenhart, Zaneti Jr. e Vitorelli [2] afirmam: “(…) a natureza coletiva da liquidação e do cumprimento não se desnaturam, mesmo que o proveito econômico decorrente do procedimento se destine a cada indivíduo lesado”. E prosseguem com muita razão: “Não faz nenhum sentido prático exigir que cada pessoa provoque a movimentação do Poder Judiciário com uma demanda individual, quando há viabilidade de solução integralmente coletiva do litígio.”

Código de Defesa do Consumidor

Apesar da óbvia economicidade pública das execuções coletivas, os votos lançados — ministro Toffoli (relator) e ministro Alexandre de Moraes — chocam-se. O ministro relator nega a legitimidade ministerial para liquidação coletiva (limitando-a à eventual e tardia execução fluída, “fluid recovery”), enquanto ministro Moraes aceita a legitimidade coletiva para liquidação e execução.

Na verdade, os ministros debatem temas inconfundíveis mas relacionáveis entre si.

Para começar por que o Microssistema de Processo Coletivo, à luz do Código de Defesa do Consumidor (CDC, artigo 97 e 98) prevê a convivência entre execução coletiva e individual de sentença coletiva envolvendo direitos individuais homogêneos, bem como entre legitimados coletivos e individuais. Isso, por si, deveria bastar ao Supremo para notar a inexistência de exclusão normativa entre um regime e outro.

Ademais, a posição de Moraes é adequada aos temas nº 471 e nº 850, os quais reconhecem a legitimação institucional coletiva ao Ministério Público quanto aos direitos individuais homogêneos quando houver transcendência e interesse social — acentuando o caráter objetivo (quanto à defesa ordem jurídica) da legitimação dessa instituição que é o “Custos Iuris” constitucional, inclusive em prol das coletividades.

Efeitos financeiros contra o contribuinte

Desse modo, é preciso convir que os ministros votantes, na verdade, debateram temas distintos e sem distinguir duas questões de maneira mais incisiva: (1ª) a situação na qual a atividade individual é imprescindível à liquidação e à execução — perceptível no voto do ministro Toffoli; e (2ª) o caso no qual os dados necessários à liquidação e execução já estão devidamente pré-definidas ou são acessíveis coletivamente — existindo “maturidade executiva coletiva“, permitindo-se por fatores de economicidade e eficiência, a liquidação e execução coletiva imediata.

Portanto, ao decidir o Tema nº 1.270, o STF deve estar atento aos deletérios efeitos financeiros contra o contribuinte e, igualmente, sobre as filas judiciais que pode acarretar a negativa abstrata à execução coletiva. Uma vez negada a via coletiva, centenas e milhares de ações (desnecessárias) poderão tumultuar ainda mais o (hiper)demandado Poder Judiciário brasileiro, impondo, mais uma vez, ao vulnerável contribuinte o custeio de um aparato público cada vez mais sufocado por decisões ineficientes à defesa efetiva de direitos — decisões essas que, ironicamente, podem emanar de sua cúpula.

[1] ZUFELATO, Parecer. Tema n. 1270. Autos do RExt n. 1.449.302, p. 20 do parecer.

[2] ARENHART, Sérgio Cruz. ZANETI JR., Hermes. VITORELLI, Edilson. Liquidação e execução coletiva de obrigação de pagar quantia a indivíduos identificados: o Tema 1.270 da Repercussão Geral. Revista de Processo. São Paulo, v. 357, p. 271-295, Nov. 2024.

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