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Newton: A necessária reforma administrativa na Defensoria Pública

O artigo aborda a urgente necessidade de reforma administrativa na Defensoria Pública, enfatizando sua natureza transitória e a importância da participação social na discussão. Os autores argumentam que a Defensoria enfrenta os riscos de sucateamento devido ao contexto neoliberal e à falta de valorização dos diversos profissionais que a compõem, necessitando de uma gestão mais inclusiva e eficiente. A defesa de um modelo de assistência jurídica pública e acessível é apresentada como crucial para garantir a sobrevivência da instituição e a efetividade de seus serviços.

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A afirmação de que a Defensoria Pública é uma criação humana e, por isso, convive com defeitos, é tautológica. Mais importante do que realizar um estudo descritivo é refletir sobre o aprimoramento institucional. O fato de o Congresso Nacional debater, a título de emenda constitucional, uma eventual reforma administrativa propicia que esse tema possa então ser debatido pela instituição defensorial e, principalmente, pela sociedade.

Não se pode ignorar ainda o fato de que o público-alvo das defensorias públicas não é atrativo para o investimento privado. Nesse momento, em que o neoliberalismo pauta a discussão sobre a reformulação estatal, subsiste um sério perigo para a instituição em si, ou seja, o seu sucateamento e, o pior, a precariedade na prestação do seu serviço sendo naturalizada pela sociedade. Participar desse debate, no plano ideológico, é uma luta pela sobrevivência do modelo constitucional de assistência jurídica gratuita e integral. E que não se repute como retórica alarmista, pois na lógica neoliberal não subsiste espaço para uma intervenção nos moldes realizados pelas defensorias públicas, tal como aponta Naomi Klein:

“A contrarrevolução da Escola de Chicago pretendia eliminar todas as formas de proteção que os trabalhadores haviam conquistado e todos os serviços públicos que o Estado oferecia com o objetivo de aparar as arestas do mercado” [1].

Antes de qualquer coisa, é preciso que as administrações das defensorias públicas reconheçam e, principalmente, concretizem as suas naturezas transitórias. No modelo republicano, o exercício do poder não é vitalício. A alternância de grupos se mostra importante e necessária para a reflexão e o agir crítico.

Além de abandonar essa postura própria de um regime oligárquico, as administrações das defensorias públicas precisam adotar uma visão plural sobre o fenômeno do poder. Leonardo Boff e Mark Hathawy fornecem as pistas necessárias para uma verdadeira transformação ideológica sobre a concepção do poder. É imprescindível superar a visão do “poder sobre”, isto é, do poder de hierarquizar:

“Um segundo tipo de poder (…) é o poder de dentro. Este é o poder que sustenta toda a vida; é o poder da criatividade, da cura e do amor. Essa forma de poder é experimentada especialmente quando as pessoas agem conjuntamente para se oporem aos controles do poder sobre. Evidentemente, o poder de dentro está essencialmente presente naquilo que é muitas vezes chamado de ’empoderamento’, e, assim, esta forma de poder é conectada a muitos modelos de educação e de ações políticas de libertação (…) A terceira modalidade pela qual o poder pode ser expresso é o chamada de poder em conjunto ou poder de influenciar ou poder como processo. A fonte desse poder está na vontade de outros escutar nossas ideias. O poder em conjunto nos permite agir em comunhão e estabelecer organizações verdadeiramente participativas” [2].

As administrações das defensorias públicas abandonariam, portanto, uma concepção verticalizada e descendente de poder. Outros modelos de gestão poderiam ser praticados, inclusive com maior participação do único soberano na ordem jurídica brasileira: o povo. Além de ouvir a população, e não somente a dita sociedade organizada, os integrantes da carreira que se encontram nas planícies seriam ouvidos, e não simplesmente lembrados às vésperas de eleições internas.

As defensorias públicas não são compostas somente por defensoras e defensores públicos, pois os servidores e os estagiários também nela laboram e merecem ser valorizados, sendo certo que esse reconhecimento não se esgota na questão remuneratória. Funções administrativas, por exemplo, não precisam ser necessariamente exercidas por defensores. Servidores com conhecimento especializado poderão exercer rotinas administrativas de forma eficaz e a atividade-fim poderá ser realizada por quem não deveria estar afastado do front.

O prazo estabelecido na Emenda Constitucional nº 80/14 se encontra próximo de seu termo final e ele deve ser considerado como inegociável diante de um cenário de uma reforma administrativa pautada no discurso de diminuição de gastos, déficits e dívidas públicos.

A cobrança pelo fiel cumprimento da Emenda Constitucional nº 80/14 tem o seu preço. De nada adianta querer mais agentes públicos responsáveis pela efetivação da norma constitucional que impõe o modelo público de assistência jurídica enquanto diversas assessorias são criadas e se mostram completamente incapazes de apresentar um mínimo resultado. A música popular brasileira traz uma importante lição para essa situação: todo artista tem de ir aonde o povo está. Não se está a defender o fim de todas as assessorias internas, mas daquelas que se mostram desprovidas de qualquer utilidade republicana.

Diante da ameaça que pode ser promovida pela reforma administrativa, cabe à Defensoria Pública refletir e agir de forma inteligente. Reconhecer a transitoriedade do exercício do poder e outras formas desse fenômeno constitui um primeiro passo. Valorizar, e não pelo viés corporativista, mas, sim, porque a instituição não se restringe aos defensores e defensoras públicas é um segundo passo. Por fim, saber alocar racionalmente os seus membros, pois assessorias com nomes pomposos ou especiais podem inflar egos, mas pouco têm acrescentado para as instituições. É claro que diversas outras medidas podem ser tomadas, tomara que a oportunidade não seja perdida.

[1] KLEIN, Naomi. A doutrina de choque. A ascensão do capitalismo de desastre. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008. p. 73.

[2] BOFF, Leonardo & HATHAWAY, Mark. O tao da libertação. Explorando a ecologia da transformação. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 2012. pp. 136-137.

Referências

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