Artigos Empório do Direito – Primeiras reflexões sobre a lei nº. 13.654/2018

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Primeiras reflexões sobre a lei nº. 13.654/2018

O artigo aborda as implicações da Lei nº 13.654/2018, que trouxe alterações significativas ao Código Penal, visando um tratamento mais rigoroso para crimes de furto e roubo envolvendo explosivos. Os autores analisam as novas qualificadoras, os aumentos de pena e a revogação de certas causas de aumento, ressaltando as nuances na aplicação das penalidades e as possíveis controvérsias jurídicas que surgem dessa legislação. A discussão foca em como as modificações podem impactar a individualização da pena e o julgamento de casos complexos, especialmente em situações de concurso de pessoas.

Artigo no Empório do Direito

INTRODUÇÃO

No último dia 23 de abril de 2018 entrou em vigor a Lei nº. 13.654/2018, responsável por importantes alterações na Parte Especial do Código Penal.

A alteração legislativa certamente foi motivada pelo crescente índice de subtrações ocorridas em instituições financeiras, mediante a utilização de explosivos, notadamente nas cidades de interior com menor estrutura de segurança pública. Vejamos:

Em relação ao crime de furto, houve o acréscimo de 02 (duas qualificadoras: i) quando houver emprego de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum (CP, art. 155, §4º-A); ii) quando o objeto material consistir em substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego (CP, art. 155, §7º).

Coerentemente, em relação ao crime de roubo, houve o acréscimo de 03 (três) novas hipóteses de aumento de pena quando: i) a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma de fogo (CP, art. 157, §2º-A, I); ii) há destruição ou rompimento de obstáculo mediante o emprego de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum (CP, art. 157, §2º-A, II); iii) o objeto material for substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego (CP, art. 157, §2º, VI). Por outro lado, aumentou sensivelmente a pena do roubo qualificado pela lesão corporal grave (CP, art. 157, §3º).

A DERROGAÇÃO DE UMA DAS CAUSAS DE AUMENTO DO ROUBO

A análise sistemática da nova lei permite concluir que seu objetivo foi conferir um tratamento penal mais severo a uma forma específica de subtração: aquela que envolve substâncias explosivas e acessórios, seja como instrumento empregado na conduta criminosa, seja como objeto material do crime. Em parte o objetivo foi alcançado, mas o tiro saiu pela culatra.

A redação do §2º previa o seguinte: “A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) até metade: I – se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma”.

Como a lei fazia menção genérica a “arma”, prevalecia o entendimento[1] que o termo alcançava: i) arma própria – criadas para defesa ou ataque (ex: armas de fogo, punhal, etc…); ii) arma imprópria – não foram criadas, mas podem servir para defesa e ataque (ex: faca de cozinha, barra de ferro, etc…).

O inciso em comento foi expressamente revogado e consta em parte no novo §2º-A: “A pena aumenta-se de 2/3 (dois terços): I – se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma de fogo”.

Estamos diante simultaneamente de: i) novatio legis in pejus (no tocante ao aumento de pena que passa de 1/3 até metade para 2/3); ii) novatio legis in mellius (pois a lei restringe o aumento para arma de fogo).

Em outras palavras: aquele que comete um crime de roubo, com emprego de arma que não seja de fogo, deverá responder pelo roubo simples (CP, art. 157, caput) e não mais pelo roubo circunstanciado (CP, art. 157, §2º-A, I).

Quanto ao ponto, tratando-se de lei penal mais benéfica, deverá retroagir para alcançar fatos cometidos antes da sua entrada em vigor (CRFB, art. 5º, XL), inclusive, nos casos em que haja sentença penal condenatória com trânsito em julgado, cabendo ao juízo da execução afastar o aumento eventualmente empregado (LEP, art. 66, I c/c STF, súmula 611).

AS NOVAS MAJORANTES DO ROUBO E A FORMA DE INCIDÊNCIA

Outra questão interessante, que certamente causará polêmica, diz respeito a forma de incidência nos casos de pluralidade de causas de aumento. Duas hipóteses poderão ocorrer:

Pluralidade de moduladoras com idêntico quantum de aumento de pena variável;

Um exemplo: roubo cometido em concurso de pessoas, cujo objeto material seja substância explosivas ou de acessórios (CP, art. 157, §2º, II e VI). Duas moduladoras com idêntico quantum de aumento de pena variável (1/3 até 1/2).

O complicador aqui reside no fato da lei não estabelecer qual critério deve ser utilizado para definir concretamente o aumento, já que existe uma margem variável.

O primeiro entendimento sustenta que uma das causas de aumento de pena deverá ser utilizada no percentual de aumento na terceira fase, ao passo que as demais, como circunstâncias judiciais desfavoráveis na fixação da pena-base.

O segundo entendimento[2] defende o critério eminentemente objetivo: o número de causas de aumento de pena incidentes à hipótese fática. Tal critério tem a vantagem de estabelecer um maior controle contra o arbítrio judicial.

Uma terceira corrente[3] sustenta que deve ser levado em consideração não apenas o número de causas de aumento de pena, mas sim a gravidade em concreto das moduladoras.

Este parece ter sido o entendimento adotado na súmula súmula 443 do STJ: “O aumento na terceira fase de aplicação da pena no crime de roubo circunstanciado exige fundamentação concreta, não sendo suficiente para sua exasperação a mera indicação do número de majorantes”.

Dessa forma, o elevado número de participantes (no caso de concurso de agentes) ou mesmo o tempo de privação (no caso de restrição da liberdade da vítima), seriam elementos que poderiam justificar um aumento acima do mínimo.

Não obstante, entendemos que o melhor critério, por permitir uma melhor individualização da reprimenda, é aquele que utiliza como referência o grau de culpabilidade determinado no momento da fixação da pena-base[4].

Em outras palavras: é a partir das circunstâncias judiciais que será determinada uma culpabilidade mínima, média ou máxima, a ser utilizada na calibragem do quantum de aumento. Não há qualquer tipo de bis in idem, pois inexiste valoração isolada das circunstâncias judiciais e sim no seu conjunto, que irá definir o grau de reprovação da conduta.

Pluralidade de moduladoras com distintos quantum de aumento de pena fixo;

Uma hipótese muito comum na prática: roubo cometido em concurso de pessoas e emprego de arma de fogo. Temos 02 (duas) causas de aumento de pena: i) concurso de pessoas (aumento de 1/3 até metade); ii) emprego de arma de fogo (aumento de 2/3).

A resposta está no artigo 68, parágrafo único do Código Penal: “No concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas na parte especial, pode o juiz limitar-se a um só aumento ou a uma só diminuição, prevalecendo, todavia, a causa que mais aumente ou diminua”.

A questão é: utilizada a causa que mais aumente o que fazer com a que restou? Ex: utilizado o emprego de arma de fogo para aumentar a pena provisória em 2/3, deveria o concurso de pessoas ser ignorado? A discussão é antiga e ganhará fôlego.

Uns sustentam[5] que deve ser utilizado o mesmo raciocínio dos crimes pluriqualificados. Assim, se a causa de aumento restante for prevista como agravante, deve ser considerada como tal na segunda fase. Do contrário, a saída será utilizá-la como circunstância judicial desfavorável na primeira fase.

Outros sustentam[6] que a causa de aumento restante deverá ser de todo desprezada, pois do contrário, haveria desrespeito a uma regra legal expressa em escancarado prejuízo ao réu. Não pode uma causa especial de aumento de pena ser deslocada para a primeira fase da dosimetria quando há lei em sentido contrário.

Entendemos mais adequado o primeiro entendimento, uma vez que melhor efetiva o princípio constitucional da individualização da pena (CRFB, art. 5º, XLVI).

Notas e Referências:

[1]Na doutrina: GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte especial, vol II: introdução à teoria geral da parte especial: crimes contra a pessoa, 15ª edição – Niterói, RJ: Ed. Impetus, 2018, pg. 641/642. Supremo Tribunal Federal: STF – HC 110.746/MT, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em 13/11/2012, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-242 DIVULG 10-12-2012 PUBLIC 11-12-2012 Superior Tribunal de Justiça: STJ – AgRg no AREsp 677.554/SC, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 25/04/2017, DJe 03/05/2017.

[2] Na doutrina: GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte especial, vol II: introdução à teoria geral da parte especial: crimes contra a pessoa, 15ª edição – Niterói, RJ: Ed. Impetus, 2018, pg. 660. Na jurisprudência: TJRS – Apelação Crime Nº 70037887114, Oitava Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Fabianne Breton Baisch, Julgado em 15/09/2010

[3] NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal comentado, 3ª edição – São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, pg. 515.

[4] BOSCHI, José Antônio Paganella. Das penas e seus critérios de aplicação, 5ª edição, revista, atualizada e ampliada – Porte Alegre: Ed. Livraria do Advogado, 2011, pg. 269. CARVALHO, Salo de. Penas e medidas de segurança no direito penal brasileiro, 2ª edição – São Paulo: Ed. Saraiva, 2015, pg. 448/449.

[5] STJ – HC 10.042/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 21/09/1999, DJ 18/10/1999.

[6] BOSCHI, José Antônio Paganella. Das penas e seus critérios de aplicação, 5ª edição, revista, atualizada e ampliada – Porte Alegre: Ed. Livraria do Advogado, 2011, pg. 272.

Imagem Ilustrativa do Post: Attendee lists // Foto de: Quinn Dombrowski // Sem alterações

Disponível em: https://www.flickr.com/photos/quinnanya/3183174451

Licença de uso: http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/legalcode

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