• DADOS DO PROCESSO – `STF – Habeas Corpus (HC) 243077 – MINISTRO RELATOR: EDSON FACHIN – 27/09/2024`

      FATOS

      – Em 26 de março de 2011, a vítima de um assalto em seu estabelecimento comercial identificou dois indivíduos como autores do crime: um homem negro, magro e alto, usando capacete preto e apontando uma arma, e outro homem branco, passageiro da motocicleta, sem capacete.

      – A vítima, em sede policial, realizou o reconhecimento fotográfico dos acusados ao ser apresentada a um álbum de fotos. Identificou o acusado, ora paciente do HC, com base na feição dos olhos, pois ele usava capacete no momento do crime.

      – O delegado indiciou o acusado, apesar de dúvidas quanto à autoria, ressaltando que a vítima o reconheceu pelos olhos “com muita segurança”, mas baseando-se apenas nesse elemento.

      – O Ministério Público inicialmente não requereu a prisão preventiva do acusado, mas, após tentativa fracassada de localizá-lo para novo interrogatório, pediu sua prisão preventiva com base na condição de foragido.

      – O magistrado de primeiro grau decretou a prisão preventiva, argumentando a necessidade para garantia da ordem pública e da aplicação da lei penal, além de sustentar a gravidade do crime e o risco de fuga, considerando a ausência de vínculos do acusado com o distrito da culpa.

      – Não foram obtidos outros elementos probatórios que corroborassem a autoria além do reconhecimento fotográfico e posterior reconhecimento pessoal no inquérito.

      PROBLEMA JURÍDICO

      QUESTÃO CENTRAL – O reconhecimento fotográfico feito de maneira informal, sem observância das garantias processuais mínimas previstas no art. 226 do CPP, pode fundamentar a prisão preventiva e a ação penal contra o acusado, especialmente na ausência de outras provas?

      PONTOS CONTROVERTIDOS

      1. A legalidade do reconhecimento fotográfico e pessoal feito sem os requisitos do art. 226 do CPP.

      2. A possibilidade de prisão preventiva com base exclusivamente no reconhecimento fotográfico.

      3. A validade das provas derivadas de reconhecimento considerado ilícito, com base na teoria dos frutos da árvore envenenada (art. 157, § 1º, do CPP).

      4. A compatibilidade da descrição física feita pela vítima com o acusado.

      5. O tempo transcorrido entre o crime (2011) e o julgamento (2024), e seus impactos sobre a memória e validade dos testemunhos.

      DIREITO APLICÁVEL

      – **Código de Processo Penal (CPP), art. 226**: Estabelece as formalidades para o reconhecimento de pessoas, garantindo a imparcialidade e precisão no ato.

      – **Código de Processo Penal (CPP), art. 157, § 1º**: Provas derivadas de provas ilícitas são inadmissíveis.

      – **Jurisprudência do STF e STJ**: O reconhecimento fotográfico feito de forma informal e sem observância das normas do art. 226 do CPP é considerado nulo, não podendo fundamentar a prisão preventiva ou ação penal na ausência de outras provas (RHC 206846, Relator: Gilmar Mendes).

      – **Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada**: Prova ilícita contamina todas as provas derivadas dela.

      ANÁLISE E APLICAÇÃO

      ARGUMENTOS E PROVAS DO MP

      – O reconhecimento do acusado se baseou unicamente na semelhança dos olhos, dado que ele usava capacete durante o assalto.

      – O reconhecimento fotográfico foi realizado em descompasso com o art. 226 do CPP, já que as fotos apresentadas pertenciam a pessoas registradas na delegacia, o que pode ter sugestionado a vítima.

      – A descrição física feita pela vítima (homem negro, alto e magro) não é compatível com o acusado (mediano em altura e compleição).

      – A doutrina e a jurisprudência destacam a falibilidade da memória humana, especialmente em situações de estresse e na ausência de formalidades no reconhecimento.

      – A ausência de outras provas além do reconhecimento fotográfico torna o caso frágil, não sustentando a prisão preventiva nem a ação penal.

      – Estudos indicam que testemunhas oculares são suscetíveis a erros e influências externas, reforçando a dúvida sobre a validade do reconhecimento.

      ARGUMENTOS E PROVAS DO RÉU

      – A vítima realizou o reconhecimento do acusado com segurança, tanto no reconhecimento fotográfico quanto no pessoal, em sede policial.

      – A condição de foragido do acusado e sua ausência em interrogatórios justificaram a decretação da prisão preventiva, segundo a jurisprudência consolidada do STF.

      – A gravidade do crime e o risco à ordem pública e à aplicação da lei penal sustentam a necessidade da prisão preventiva, além do possível impacto do acusado sobre testemunhas e a vítima.

      CONCLUSÃO

      O Supremo Tribunal Federal, por meio do voto do relator, **Ministro Edson Fachin**, reconheceu a nulidade do reconhecimento fotográfico e pessoal, realizados sem observância das formalidades do CPP, especialmente por terem sido feitos com base apenas na semelhança dos olhos. Além disso, destacou-se a incompatibilidade da descrição física do acusado e a ausência de outras provas que pudessem corroborar a autoria.

      O HC foi concedido de ofício para revogar o mandado de prisão preventiva e determinar o **trancamento da ação penal**, com fundamento na ausência de indícios mínimos de autoria. A decisão se amparou na fragilidade do reconhecimento como único elemento de prova, ressaltando os perigos de erros judiciais decorrentes de falhas na memória humana e da inobservância das garantias processuais.

      AgRg no RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 188922 – SP (2023/0382262-6)

      Curadoria Conteúdos, Marcio Souza De Almeida e Marco Aurélio Vicente Vieira
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