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Rafael Paraguassú De Oliveira publicou algo
DADOS DO PROCESSO – `STF – Habeas Corpus (HC) 243077 – MINISTRO RELATOR: EDSON FACHIN – 27/09/2024`
FATOS
– Em 26 de março de 2011, a vítima de um assalto em seu estabelecimento comercial identificou dois indivíduos como autores do crime: um homem negro, magro e alto, usando capacete preto e apontando uma arma, e outro homem branco, passageiro da motocicleta, sem capacete.
– A vítima, em sede policial, realizou o reconhecimento fotográfico dos acusados ao ser apresentada a um álbum de fotos. Identificou o acusado, ora paciente do HC, com base na feição dos olhos, pois ele usava capacete no momento do crime.
– O delegado indiciou o acusado, apesar de dúvidas quanto à autoria, ressaltando que a vítima o reconheceu pelos olhos “com muita segurança”, mas baseando-se apenas nesse elemento.
– O Ministério Público inicialmente não requereu a prisão preventiva do acusado, mas, após tentativa fracassada de localizá-lo para novo interrogatório, pediu sua prisão preventiva com base na condição de foragido.
– O magistrado de primeiro grau decretou a prisão preventiva, argumentando a necessidade para garantia da ordem pública e da aplicação da lei penal, além de sustentar a gravidade do crime e o risco de fuga, considerando a ausência de vínculos do acusado com o distrito da culpa.
– Não foram obtidos outros elementos probatórios que corroborassem a autoria além do reconhecimento fotográfico e posterior reconhecimento pessoal no inquérito.
PROBLEMA JURÍDICO
QUESTÃO CENTRAL – O reconhecimento fotográfico feito de maneira informal, sem observância das garantias processuais mínimas previstas no art. 226 do CPP, pode fundamentar a prisão preventiva e a ação penal contra o acusado, especialmente na ausência de outras provas?
PONTOS CONTROVERTIDOS
1. A legalidade do reconhecimento fotográfico e pessoal feito sem os requisitos do art. 226 do CPP.
2. A possibilidade de prisão preventiva com base exclusivamente no reconhecimento fotográfico.
3. A validade das provas derivadas de reconhecimento considerado ilícito, com base na teoria dos frutos da árvore envenenada (art. 157, § 1º, do CPP).
4. A compatibilidade da descrição física feita pela vítima com o acusado.
5. O tempo transcorrido entre o crime (2011) e o julgamento (2024), e seus impactos sobre a memória e validade dos testemunhos.
DIREITO APLICÁVEL
– **Código de Processo Penal (CPP), art. 226**: Estabelece as formalidades para o reconhecimento de pessoas, garantindo a imparcialidade e precisão no ato.
– **Código de Processo Penal (CPP), art. 157, § 1º**: Provas derivadas de provas ilícitas são inadmissíveis.
– **Jurisprudência do STF e STJ**: O reconhecimento fotográfico feito de forma informal e sem observância das normas do art. 226 do CPP é considerado nulo, não podendo fundamentar a prisão preventiva ou ação penal na ausência de outras provas (RHC 206846, Relator: Gilmar Mendes).
– **Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada**: Prova ilícita contamina todas as provas derivadas dela.
ANÁLISE E APLICAÇÃO
ARGUMENTOS E PROVAS DO MP
– O reconhecimento do acusado se baseou unicamente na semelhança dos olhos, dado que ele usava capacete durante o assalto.
– O reconhecimento fotográfico foi realizado em descompasso com o art. 226 do CPP, já que as fotos apresentadas pertenciam a pessoas registradas na delegacia, o que pode ter sugestionado a vítima.
– A descrição física feita pela vítima (homem negro, alto e magro) não é compatível com o acusado (mediano em altura e compleição).
– A doutrina e a jurisprudência destacam a falibilidade da memória humana, especialmente em situações de estresse e na ausência de formalidades no reconhecimento.
– A ausência de outras provas além do reconhecimento fotográfico torna o caso frágil, não sustentando a prisão preventiva nem a ação penal.
– Estudos indicam que testemunhas oculares são suscetíveis a erros e influências externas, reforçando a dúvida sobre a validade do reconhecimento.
ARGUMENTOS E PROVAS DO RÉU
– A vítima realizou o reconhecimento do acusado com segurança, tanto no reconhecimento fotográfico quanto no pessoal, em sede policial.
– A condição de foragido do acusado e sua ausência em interrogatórios justificaram a decretação da prisão preventiva, segundo a jurisprudência consolidada do STF.
– A gravidade do crime e o risco à ordem pública e à aplicação da lei penal sustentam a necessidade da prisão preventiva, além do possível impacto do acusado sobre testemunhas e a vítima.
CONCLUSÃO
O Supremo Tribunal Federal, por meio do voto do relator, **Ministro Edson Fachin**, reconheceu a nulidade do reconhecimento fotográfico e pessoal, realizados sem observância das formalidades do CPP, especialmente por terem sido feitos com base apenas na semelhança dos olhos. Além disso, destacou-se a incompatibilidade da descrição física do acusado e a ausência de outras provas que pudessem corroborar a autoria.
O HC foi concedido de ofício para revogar o mandado de prisão preventiva e determinar o **trancamento da ação penal**, com fundamento na ausência de indícios mínimos de autoria. A decisão se amparou na fragilidade do reconhecimento como único elemento de prova, ressaltando os perigos de erros judiciais decorrentes de falhas na memória humana e da inobservância das garantias processuais.
AgRg no RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 188922 – SP (2023/0382262-6)